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Isolamento político, crise econômica e reação do STF: entenda os motivos por trás do recuo de Bolsonaro

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10/09/2021 – 08h58

Guinada de 180 graus de Bolsonaro ocorreu após uma campanha iniciada por alguns de seus auxiliares de primeiro e segundo escalões logo após os atos de 7 de setembro

Dois dias depois de elevar a crise institucional ao maior patamar até então, o presidente Jair Bolsonaro freou a ofensiva contra o Judiciário e divulgou uma carta em que atribuiu seus xingamentos e ameaças contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) a um arroubo provocado pelo “calor do momento”. No documento, intitulado “Declaração à Nação” e redigido com a ajuda do ex-presidente Michel Temer, ele sustenta ainda que não teve a intenção de agredir outros Poderes. O gesto, embora tenha aliviado a tensão por ora, foi visto com ceticismo na Corte.

A guinada de 180 graus de Bolsonaro ocorreu após uma campanha inciada por alguns de seus auxiliares de primeiro e segundo escalões logo após os atos de 7 de setembro. Os ministros Ciro Nogueira, da Casa Civil; e Flávia Arruda, da secretaria de Governo, assim como o advogado-geral da União, Bruno Bianco, transmitiram ao chefe que o esgarçamento da relação com o STF, principalmente, e o Legislativo havia atingido níveis insustentáveis. Ainda assim, mesmo interlocutores próximos de Bolsonaro foram pegos de surpresa pela carta.

O movimento guarda relação direta com a forte e quase imediata repercussão negativa do ataques presidenciais. Entre as consequências, o assunto impeachment subiu de temperatura da Câmara, e medidas importantes para conter a escalada da crise econômica, como a construção de uma saída para o aumento dos precatórios em 2022, em negocião no Supremo, emperraram.

Além disso, o presidente se viu isolado como nunca. Recebeu críticas ferrenhas disparadas desde aliados do Centrão, sua base de sustentação política, a presidentes de órgãos da República, como os ministros Luiz Fux (STF), Luís Roberto Barroso (Tribunal Superior Eleitoral) e Arthur Lira (Câmara). Paralelamente, os protestos de caminhoneiros bolsonaristas saíram do controle do Palácio do Planalto, o que ficou evidente com os bloqueios de estradas país afora.

“Nunca tive nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes. A harmonia entre eles não é vontade minha, mas determinação constitucional que todos, sem exceção, devem respeitar[…]. Por isso, quero declarar que minhas palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum”, afirmou Bolsonaro.

O gesto foi comemorado pela ala política do governo, especialmente após o súbito crescimento da bolsa. O ministro da Economia, Paulo Guedes, também reagiu com satisfação. Ao jornal O Globo, disse considerar que a carta já mudou o clima para a aprovação do impasse dos precatórios.

Os sinais de temperança presidencial, porém, sofreram uma recaída horas mais tarde. Durante a tradicional transmissão ao vivo das noites de quinta-feira, Bolsonaro se utilizou de provocações chulas para responder a Barroso. Pela manhã, o presidente do TSE havia proferido um duro discurso para rebater os ataques feitos por Bolsonaro no Dia da Independência.

— Insulto não é argumento. Ofensa não é coragem. A incivilidade é uma derrota do espírito. A falta de compostura nos envergonha perante o mundo — afirmou o ministro.

Durante sua live, Bolsonaro comentou a “Declaração à nação”, que irritou parte dos seus apoiadores, favoráveis à radicalização do discurso. O presidente confirmou que o texto foi elaborado com Temer, responsável pela maior parte do seu conteúdo, pediu paciência aos críticos e elencou os efeitos positivos registrados após seu passo atrás:

— Fiz uma nota hoje que muita gente me criticou[…]. Você quer gasolina mais barata, não quer? Gás. É tudo indexado. Às 3 horas (15h) publicamos a nota, e a bolsa subiu 2%, 2.800 pontos e o dólar caiu 2%. Espero que continue caindo amanhã.

Destinatário principal do pedido de cessar fogo, o Supremo reagiu com cautela. Reservadamente, em conversas com interlocutores, Fux classificou o comunicado como um “bom sinal”. A avaliação majoritária na Corte é de que só o tempo vai revelar a real disposição de Bolsonaro em baixar armas. Ministros admitem, contudo, que trata-se da mais importante sinalização do presidente desde o início da crise institucional.

Além de ter convencido Bolsonaro a publicar a carta com o recuo, Temer promoveu uma conversa por telefone entre o presidente e Alexandre de Moraes. O ex-presidente confirmou à CNN que os dois se falaram, mas não deu detalhes do conteúdo do diálogo.

— Num dado momento, me afastei para que os dois conversassem com mais privacidade — afirmou o emedebista.(O Globo)

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