Início Últimas Notícias Governo destinou R$ 5,7 bilhões do orçamento secreto nos últimos dias de...

Governo destinou R$ 5,7 bilhões do orçamento secreto nos últimos dias de 2021

0
Vista do Palácio do Planalto, sede do governo do Brasil, com o Congresso Nacional no segundo plano

O governo federal empenhou, ou seja, separou para gastar cerca de R$ 5,7 bilhões do chamado orçamento secreto, um instrumento pelo qual o Executivo destina dinheiro por indicação de parlamentares sem que eles sejam identificados, nas últimas três semanas de 2021. O montante, reservado entre os dias 7 e 31 de dezembro, é maior do que todo o volume de recursos liberados durante os oito primeiros meses do ano passado – R$ 4,9 bilhões. Além disso, equivale um empenho de R$ 237,5 milhões por dia no período.

Em sua maior parte, esse dinheiro distribuído de janeiro a agosto beneficiou prefeituras comandadas por aliados do Centrão, base de sustentação do Palácio do Planalto, e caciques do Congresso. Por meio de um cruzamento de informações feito por especialistas do gabinete do senador Alessandro Vieira (Cidadania-RE) e dos deputados Filipe Rigoni (PSB-ES) e Tabata Amaral (PSB-SP), foi possível verificar como a partilha do orçamento secreto continua privilegiando aliados do governo.

A fatia das emendas de relator (outra alcunha do que se conhece por orçamento secreto) garantida pelo Ministério do Desenvolvimento Regional dá a medida da diferença de tratamento para amigos e adversários do governo: em todo o país, 186 prefeitos do PL, partido do presidente da República e de Flávia Arruda, foram contemplados nas últimas semanas de 2021. No mesmo período, o PP, sigla de Ciro Nogueira e do presidente da Câmara, Arthur Lira (AL), teve 180 prefeitos agraciados. A efeito de comparação, o PT, que faz oposição ao governo e tem a maior bancada da Câmara, teve 68 mandatários beneficiados por esses recursos da pasta.

O maior volume das verbas destinadas no final 2021 é proveniente da Fundação Nacional da Saúde (Funasa), que empenhou R$ 2 bilhões, recursos fragmentados e distribuídos para diferentes cidades. A principal beneficiada foi Jequiá da Praia, no litoral de Alagoas, com um convênio de R$ 10 milhões assinado em 31 de dezembro para a construção de um sistema de coleta e tratamento de esgoto. Segundo os documentos divulgados no Portal da Transparência, o valor foi destravado mediante emenda de relator. O nome do autor da verba, porém, não foi divulgado.

Com 12 mil habitantes e o status de cidade mais jovem do estado, Jequiá da Praia é governada por um prefeito aliado do presidente da Câmara. Em julho do ano passado, em uma rodada de viagens pelo interior de Alagoas, Lira anunciou que o saneamento básico alcançaria 100% da cidade. O município é vizinho de Barra de São Miguel (AL), cujo prefeito é Benedito Lira, pai do presidente da Câmara. Procurado por meio de sua assessoria, Arthur Lira não comentou sobre os valores empenhados. A prefeitura de Jequiá, a Funasa e o Ministério da Saúde também não responderam.

O segundo maior volume de repasses de emendas de relator foi feito por meio do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), que empenhou R$ 1,91 bilhão. A maior fatia, de R$ 153 milhões, foi destinada ao Departamento de Estradas de Rodagens do Acre (Deracre), estado natal do relator do Orçamento de 2021, o senador Márcio Bittar (PSL). O presidente do órgão, Petronio Aparecido Chaves Antunes, confirmou que a emenda foi uma indicação de Bittar.

Procurado, o MDR não explicou por que Bittar ficou com a maior fatia do orçamento secreto da pasta. “Os empenhos obedecem aos critérios previstos no decreto 10.426/2020, nos manuais das ações orçamentárias, transferências voluntárias e na Política Nacional do Desenvolvimento Regional”, disse a pasta em nota.

O terceiro maior repasse do orçamento secreto liberado no fim de 2021 foi realizado pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), comandada por políticos do PP e do DEM. A estatal distribuiu R$ 954 milhões de emendas de relator nas últimas três semanas de dezembro. Comandada por Isnaldo Pereira Neto, apadrinhado de Ciro Nogueira, a superintendência da Codevasf do Piauí empenhou pelo menos R$ 60 milhões por meio de 118 transferências bancárias, realizadas entre 14 e 30 de dezembro, a prefeitos do estado — a maior parte deles, do próprio PP.

Atualmente, a irmã do ministro, Juliana e Silva Nogueira Lima, tem um cargo de assessora do presidente da Companhia, que também abriga a mulher do deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB), aliado do ministro da Casa Civil. Procurada, a pasta não se manifestou.

Procurada, a Codevasf afirmou que a execução de recursos de emenda do relator, no ano passado, ocorreu em conformidade com as  indicações. “O empenho de recursos, etapa da execução orçamentária, não requer análise por parte de outros órgãos”, diz a nota. (Patrik Camporez e Eduardo Gonçalves/O Globo).

SEM COMENTÁRIOS

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Sair da versão mobile