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Ex-premier japonês é morto a tiros em comício

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O ex-primeiro-ministro do Japão Shinzo Abe durante o comício onde foi assassinado nesta sexta-feira. O homem ao fundo de camisa cinza é o suspeito de cometer o atentado Toshiharu Otani / JIJI PRESS / AFP

Shinzo Abe, o ex-primeiro-ministro que governou o Japão por mais tempo, morreu nesta sexta-feira vítima de um atentado na cidade de Nara, no Oeste do país. Abe, de 67 anos, o foi baleado no pescoço e na clavícula esquerda por volta das 11h30 locais (23h30 de Brasília) quando ele fazia um discurso de campanha, dois dias antes das eleições para a Câmara Alta do país. O ex-premier desmaiou e foi transportado ao hospital de helicóptero em estado inconsciente e com uma parada cardíaca.

Relatos da mídia disseram que o suspeito de 41 anos usou o que parecia ser uma arma caseira, e relatos de testemunhas e registros em vídeo indicam que ele disparou dois tiros.

O suspeito, que foi detido segundos após efetuar os disparos, foi identificado pela polícia como Tetsuya Yamagami, morador de Nara. Hoje desempregado, ele é um ex-integrante das chamadas Forças de Autodefesa do Japão, onde serviu no ramo naval por três anos, até 2005. A suposta arma do crime — uma espingarda caseira — foi recuperada. De acordo com a emissora pública NHK, o suspeito disse à polícia que estava insatisfeito com o ex-primeiro-ministro e pretendia matá-lo.

O assassinato é um episódio chocante em uma sociedade que tem algumas das leis de armas mais rígidas entre as maiores economias globais, onde poucos episódios de violência política foram registrados nos últimos 50 anos. Inejiro Asanuma, então líder do Partido Socialista, foi o último político a ser morto, com uma facada, em 1960. Houve uma tentativa de assassinato do ex-primeiro-ministro Morihiro Hosokawa em 1994.

Abe foi primeiro-ministro de 2006 a 2007, e depois entre 2012 e 2020. Ele ficou conhecido por apoiar uma estratégia de crescimento econômico agressiva destinada a combater a deflação, a chamada Abenomics, por sua visão conservadora da História e por adotar uma política externa linha-dura, apostando na militarização do Japão.

Duas estudantes que testemunharam o tiroteio disseram à NHK que ouviram um estrondo quando Abe foi baleado pela primeira vez.

— Ele não desmaiou, apenas ouvimos um estrondo muito alto, mas não parecia que nada tivesse acontecido com ele — disse uma das estudantes.

Ela disse que a fumaça foi “claramente visível após o segundo tiro” e que “o senhor Abe desmaiou no momento em que o segundo tiro foi disparado”. A outra estudante disse que o atirador “não fugiu e ficou ali, deixando sua arma por perto. Ele foi rapidamente cercado por seguranças.”

Médicos trataram Abe por quatro horas e meia, mas sem sucesso. Ele fazia um discurso de campanha para a eleição de um candidato do governista Partido Liberal Democrático (PLD), sigla que está no poder no Japão pela maior parte do tempo desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Ainda no local do atentado, bombeiros da equipe de resgate disseram que Abe não apresentava sinais vitais.

— É um ato desprezível e totalmente inaceitável, que ocorreu durante um período eleitoral, que é a base da democracia. Condeno o ato nos termos mais fortes possíveis — declarou o atua primeiro-ministro do Japão, Fumio Kishida, do PLD. Kishida disse que a campanha para as eleições de domingo continuará.

Diversos vídeo feitos por pessoas que assistiam ao discurso mostram cenas do local nas redes sociais.

‘Abenomics’

Neto de um primeiro-ministro acusado de crimes de guerra e filho de um ex-ministro das Relações Exteriores, Abe começou sua primeira passagem de um ano como primeiro-ministro em 2006. Ao renunciar em 2007 após perder a eleição para a Câmara Alta, ele citou efeitos debilitantes da colite ulcerosa, uma doença intestinal.

Durante seu segundo mandato, que começou no final de 2012, Abe adotou o programa de estímulo econômico “Abenomics”, que se tornou uma de suas principais marcas. O pacote, que aumentou muito o endividamento público japonês, mas, igualmente, o crescimento do país, tinha o objetivo de tirar a economia japonesa de décadas de deflação.

O programa baseava-se em três pilares: flexibilização monetária, estímulo fiscal e reforma corporativa. Muitas de suas promessas de reforma corporativa — incluindo esforços para empoderar as mulheres, reduzir a influência do nepotismo e mudar a cultura de trabalho arraigada — não foram concluídas.

Abe também tinha uma concepção belicosa da História, e impulsionou uma reforma da Constituição pacifista japonesa, adotada durante a ocupação americana depois da derrota do Eixo na Segunda Guerra Mundial, para expandir o papel militar do país – uma agenda que ele não conseguiu concluir por completo, e continuou a defender após sua renúncia há dois anos devido a problemas de saúde.

Seu poder político atingiu o auge em 2017, quando o Partido Liberal Democrata obteve uma vitória esmagadora em eleições gerais que lhe deu, junto com seus parceiros de coalizão, dois terços dos assentos no Parlamento. Esta era a maioria absoluta necessária para levar a cabo a revisão constitucional. Abe, contudo, nunca concretizou o sonho, com a oposição pública a tal mudança permanecendo alta.

Mesmo após deixar o poder, Abe permaneceu influente em todos os aspectos da política japonesa. Em seus discursos, ele defendia o legado de seu programa econômico e instava o público a apoiar um aumento nos gastos com defesa após a invasão da Ucrânia pela Rússia e temores de que a China possa atacar Taiwan.

Além de sua política econômica, Abe atuou a favor do livre comércio e de um “Indo-Pacífico livre e aberto”. Essa concepção geopolítica permanece no atual governo do Japão, sendo abraçada também pelo presidente dos EUA, Joe Biden, que constrói uma série de alianças na região contra uma China cada vez mais influente. Os EUA mantêm ainda hoje no Japão seu maior contingente militar na Ásia, atualmente com mais de 50 mil efetivos em várias bases.

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