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terça-feira, maio 13, 2025

Marinheiro recebe “sentença de morte” e expõe necrose política de Dourados

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30/11/2009 – 18:11

29/11/2009 14:38

Nicanor Coelho

O Marinheiro imponente feneceu. O ronco da motosserra silenciou. Os passarinhos se entristeceram, a chuva despencou sobre as folhas, os galhos e o tronco combalido da bombacácea da Rua Benjamin Constant no bairro dos universitários douradenses.

O lamento pungente da Paineira, o Marinheiro para os mais íntimos, expõe a necrose política de Dourados concretizada numa metástase crônica onde a ética e o respeito à cidadania.

A sentença de morte propalada pela Prefeitura deixou aquela vovó centenária que era mais uma sobrevivente dos crimes ambientais com os nervos à flor da pele.

O crime cometido pelo Marinheiro: ser uma árvore imponente e ocupar um grande espaço na calçada. A sentença: morrer para os fornos de uma pizzaria qualquer. Nem mesmo a beleza das flores foi suficiente para convencer do contrário.

Manhã ensolarada de sábado, 28 de novembro de 2009. Uma motosserra nervosíssima nos braços de um operário acorda do sono profundo a Paineira que sempre serviu de sombra para os carros e para os alunos do CEJAD (Centro de Educação de Jovens e Adultos de Dourados).

Suzana Arakaki, a historiadora e seu marido Manoel Capilé, o arquiteto num ato de desespero resolveram impedir a marcha fúnebre da motosserra. Denunciaram o assassinato do Marinheiro à Guarda Municipal.

Chamaram os fiscais do IMAM (Instituto de Meio Ambiente) e, se fosse possível como num filme de Hollywood, telefonariam para o FBI, para a CIA e talvez para o MacGiver, o Chuck Norris, o Rambo e outros super-heróis. Tudo isso para garantir a vida da Paineira que solenemente implorava pela vida.

Chegaram os super-heróis do povo. O IMAM nada podia fazer para evitar a morte. A Guarda Municipal muito menos. “Us omi da motoserra” traziam no colete um papel timbrado da Prefeitura com a régia autorização para o “assassinato” da árvore.

No documento oficial não existia nenhuma especificação para a ordem de corte. Dizia apenas que estava autorizado o corte de uma árvore na Rua Benjamin Constant “para fins de construção”.

Ora a Benjamin é uma rua de mais de três quilômetros nascendo na feirona da Rua Cuiabá passando pela Usina Velha, Tênis Clube, Córrego Laranja Doce até desembocar num condomínio de luxo.

A salvação do Marinheiro douradense foi impossível mas um fiscal do IMAM descobriu que a arma do crime estava sem licença. A motosserra foi apreendida.

De mãos abanando os operários sumiram no horizonte. Arakaki com sua paciência oriental e do alto da sabedoria contida em suas cãs reclama que a arvore está na calçada e não oferece nenhum perigo para a construção. Assim, segundo ela, não haveria motivos plausíveis para a derrubada do Marinheiro.

A autorização para a extinção da árvore foi conseguida por Antonio Dias Nunes, proprietário do terreno conforme denúncias feitas pela historiadora que em maio do ano passado não conseguiu impedir a morte de outra árvore nativa no mesmo endereço.

Naquela época, Arakaki fez por escrito a denuncia na Prefeitura e nada aconteceu. O crime ambiental volta a acontecer e no mesmo local.

O fornecimento de forma indiscriminada de autorizações para cortes de árvores pela Prefeitura sem que haja o consentimento do IMAM é um câncer que não tem cura. Os próprios fiscais ambientais reclamam da falta de “comunicação”.

E onde fica o respeito ás leis de proteção ambiental? O que mesmo? Será que esta seria uma pergunta inteligível na República Owariana?

E o Marinheiro? Conta a lenda que décadas e décadas atrás quando Dourados ainda é apena um curral nasceu esta paineira. A árvore cresceu, cresceu, agigantou-se. Sombra, muita sombra, sem sobra de dúvidas.

A dúvida é se ela resistiria à insanidade de quem que viveu anos e anos numa madeireira transportando canafístulas, cedros, angicos, perobas e muitas e muitas Sucupiras.

Na década de 1990, relata Suzana Arakaki, do alpendre da sua casa viu a força de um raio destroçar o tronco do Marinheiro. Foi um grande estrago. Neste caso foi a própria natureza que usou a Paineira como pára-raios.

O tempo passou, o tronco brotou novamente e o verde tomou conta da calçada. Cabalisticamente do tronco envelhecido nove troncos saíram do ventre da árvore como as pontas da estrela Baha´i de Vito Comar, o ecólogo que a exemplo de Suzana morta perto da paineira falecida.

Quase vinte anos se passaram e o Marinheiro se recompôs. O anuncio da morte da paineira foi decretado no dia 22 deste mês quando a imprensa douradense noticiou que a árvore “foi envenenada e pode morrer nos próximos meses”.

Nem deu tempo para que os técnicos do IMAM fizessem uma investigação para descobrir que perfurou e envenenou o tronco da paineira pois uma semana depois ela foi derrubada.

Como diria Valeri Jason Furtado, o cirurgião-dentista, um cidadão exemplar que se aposentou depois de décadas atuando nos Postos de Saúde da Prefeitura só resta aos douradenses bradar: até quando, até quando, até quando?

Até quando as árvores serão assassinadas. Reclama Arakaki e todas as outras suzanas que amam a natureza e que se preocupam com a vida? Desta vez foi o Marinheiro. Amanhã serão as aroeiras e os ipês espalhados pelos parques e ruas que iluminam o céu com suas flores multicores.

Assim como o Marinheiro foram assassinadas muitas sibipirunas e centenas de espécies de árvores, principalmente na área comercial do centro da cidade. Sumiu a árvore em frente a agência do Correios.

Sumiram as árvores nas calçadas de dezenas de lojas. Mortas em nome da sobrevivência de letreiros de neon e de painéis de plástico. Nem mesmo a boa vontade de Romem Barletta que todos os anos planta milhares de árvores seria suficiente para compensar os “assassinatos autorizados”.

Por fim resta-nos apenas relembrar o bordão do advogado das bandas do Amambaí comprograndense, Altair da Costa Dantas, o Alcodan, que sentencia: Assim foi, Assim é, Assim Será.

Será que será sempre assim? Não! Basta apenas que Suzana Arakaki, Manoel Capilé, Romem Barletta, Vito Comar e tantos outros cidadãos não cochilem para que a mão pesada dos políticos parem de autorizar o ronco das motosserras.

 Se cochilar o cachimbo cai, o Ministério Público não dorme. E para que a justiça seja feita que a Poder Judiciário seja o “despertador”.

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