15/05/2018 – 08h25
O governo vai fazer uma cerimônia para festejar os dois anos de Michel Temer na Presidência. O lema da solenidade imitava o bordão de Juscelino Kubitschek. “O Brasil voltou, 20 anos em dois”, diziam os convites enviados pelo cerimonial do Planalto. O slogan nem chegou a ser lançado, mas virou piada na internet. Basta tirar a vírgula e a mensagem vira uma confissão de retrocesso. Em dois anos, Temer fez o Brasil recuar duas décadas, sugeria a propaganda oficial. Com um marketing desses, o presidente não precisa de oposição.
Para quem estudou história, a comparação com os “50 anos em cinco” é mais ofensiva do que a barbeiragem publicitária. “É de um ridículo atroz. Não há nenhum ponto de contato entre os dois governos”, diz a socióloga Maria Victoria Benevides, autora do livro “O Governo Kubitschek — Desenvolvimento Econômico e Estabilidade Política”.
A professora da USP lembra que os anos JK foram marcados por um clima de otimismo. “Foi um período de euforia, desenvolvimento e criação de empregos. Agora o sentimento da população é de desencanto”, avalia.
A estratégia de se comparar com JK não chega a ser original. No passado recente, FHC e Lula também tentaram se associar à imagem do presidente bossa nova. Ao contrário de Temer, os dois chegaram ao poder pela via direta, viveram períodos de alta popularidade e conseguiram se reeleger.
Ontem a nova pesquisa CNT/MDA mostrou que a aprovação do governo continua em míseros 4%. É a metade do pior índice registrado na gestão anterior. Apesar de ter as chaves do cofre, Temer não chega a 1% das intenções de voto. Ele só lidera o ranking de rejeição, com 88%.
Apesar dos números aterradores, o presidente não desiste de fazer propaganda. Na semana passada, ele se expôs a mais um momento constrangedor. Em entrevista ao canal oficial NBR, ouviu de uma suposta telespectadora que está “melhorando a situação dos brasileiros” e que “até o desemprego melhorou”. No mundo real, a taxa aumentou pelo terceiro trimestre seguido.
“Se o Temer quiser se comparar a algum governo passado, deveria escolher o governo Collor”, sugere a professora Benevides. E ela se refere à impopularidade, não aos escândalos de corrupção.
Bernardo Mello Franco/O Globo