Há dias, meses, aliás, estou devendo um textão para responder ao questionamento do ex-deputado Walter Carneiro, numa conversa de WhatsApp em que ele falava de seu sonho em ver um dia um slogan de campanha política tipo “O interior vai governar”. O Mato Grosso do Sul, claro. O gancho veio ontem, noutro zap, do padeiro famoso Everaldo Leite, para anunciar que nesta sexta-feira o senador* Delcídio do Amaral seria o ocupante da cadeira sempre reservada a Murilo Zauith no ponto de fuxico político mais famoso de Dourados, na esquina da rua Cuiabá com a Independência.
Pra início de conversa uma heresia, quando se apura o motivo da extemporânea visita de Delcídio a Dourados – para cuidar dos preparativos da fusão do PTB com o tal do Patriota, o novo partido por ele a ser presidido no estado. O finado Getúlio Vargas, em que pese as controvérsias do pós-Lula, até aqui o maior estadista brasileiro, fundador da CAND (Colônia Agrícola Federal de Dourados), não merecia alguém com um currículo como o de Delcídio para cuidar justamente da sigla por ele também fundada. No Brasil. O histórico e respeitado peteba.
Agora, entrando no questionamento de Carneiro. Com a devida vênia ao único douradense a presidir a Assembleia Legislativa*, lembrando que até aqui os governos do ainda novo MS foram predominantemente interioranos. Exceção a Wilson Barbosa Martins, com antológica residência e escritório ali na rua XV de Novembro, próximo à praça Ari Coelho, no centro de Campo Grande, os demais governadores, todos, são oriundos do interior. Claro que quando Walter Carneiro fala em interior ele está se referindo ao acalentado sonho dos douradenses de eleger um governador ou senador.
Sonho que por muito pouco não existiria não fosse o eleitorado douradense tão tinhoso, pois que, já na primeira eleição para o governo estadual no pós-divisão o então consagrado prefeito José Elias Moreira por muito pouco não passa à história com o primeiro governador eleito do estado, perdendo para o mesmo Wilson Martins, que voltaria a se eleger em 1994. Na sequência, Pedro Pedrossian – como Renato Teixeira conta e canta, o homem de Miranda – ele que já havia sido o terceiro governador, mas nomeado, naquele turbulento período de instalação do estado, depois de Harry Amorim e Marcelo Miranda; o próprio Marcelo, mineiro, mas que virou prefeito de Campo Grande depois de se fazer político em Paranaíba; Zeca do PT, de Porto Murtinho; André Puccinelli, de Fátima do Sul; Reinaldo Azambuja, de Maracaju e, agora, também de Maracaju, Eduardo Riedel. Além de Ramez Tebet, de Três Lagoas, vice que assumiu quando Wilson Martins renunciou para disputar o senado. Nem com seus vices Dourados conseguiu dar sorte, por tudo que aqui já foi de sobejo comentado. Estreiteza de conceitos, ganância, etc. & tal.
Como se vê, a questão não é ser ou não de Dourados, de Coxim, de Corumbá, de Ponta Porã ou de Sanga Puitã. Não se trata de regionalismo, de bairrismo ou de perseguição dos campo-grandenses. Pensar grande, eis a questão. Discurso que vá ao encontro do que o eleitor quer ouvir. Pragmatismo e, claro, a tão decantada e$trutura, como dizia o maior de todos, Pedro Pedrossian.
Voltando ao local onde os ditos poderosos da política douradense costumam tomar decisões: Murilo Zauith, por exemplo, o nome nesses últimos tempos mais em voga para o governo do estado ou senado. Uma vez defenestrado, humilhado, como foi, da poderosa Secretaria de Infraestrutura do governo do estado, por Reinaldo Azambuja, de quem era também o vice-governador, em vez de ficar esquentando banco em padarias e ouvindo puxa-sacos deveria ter pegado um de seus aviões e percorrido o estado, peitando o sistema e se colocando como candidato à sucessão de seu algoz. Certamente que o resultado da eleição teria sido outro.
Bons tempos aqueles em que, na contramão do que faz hoje Delcídio do Amaral, o então prefeito douradense João Totó Câmara, como presidente estadual da antiga ARENA, despachava do lendário hotel Gaspar, nos altos da avenida Calógeras, em Campo Grande avocando para si o poder político estadual. Depois, Celso Dal Lago, presidindo no estado o partido hoje tomado de assalto por Delcídio, colocando, também, Dourados no centro do debate político. Foi nessa época que Dal Lago bradou em rede estadual de TV, num programa partidário, que Dourados, por sua importância no contexto econômico, não podia mais se contentar sendo apenas a terra dos vices (governadores) e dos suplentes (de senadores). O próprio Murilo Zauith, também por um tempo demarcando território em Campo Grande, como presidente estadual do antigo PFL e transitando entre os maiorais da política estadual.
Enquanto isso, os alquimistas, como Delcídio, continuam chegando.
—————
(*) Assim mesmo, senador é o único mandato cujos ocupantes se aposentam com o título. Mesmo tendo sido o primeiro senador preso da história, por corrupção, e com o mandato cassado, como Delcídio do Amaral.
(*) Antes da divisão do Mato Grosso o deputado douradense (depois prefeito) José Cerveira presidiu a Assembleia Legislativa.
