Com objetivo de amenizar a fome das famílias, e principalmente, das crianças palestinas vítimas da crise humanitária na Faixa de Gaza, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em parceria com o Ministério das Relações Exteriores do Governo Federal, pretende doar 100 toneladas de alimentos para o povo palestino.
Arroz, derivados de milho, leite e açúcar estão entre as duas toneladas de alimentos que integram o primeiro carregamento de doações, produzidas pelas famílias Sem Terra nas áreas de assentamento e acampamento da Reforma Agrária de todo o Brasil. As primeiras doações de produtos foram enviadas nesta segunda-feira (30), por meio de um avião da Força Aérea Brasileira (FAB), como explica a dirigente nacional do MST, Cassia Bechara.
A ação do MST busca atender parcela das cerca de 2,2 milhões de pessoas que vivem na Faixa de Gaza, que sofrem uma grave crise humanitária causada pelos bombardeiros de Israel e pelo cerco imposto ao enclave palestino, além da escassez de água, gás de cozinha e alimentos.
Segundo informações da ONU, no último domingo (29), trinta e três caminhões de ajuda humanitária entraram na Faixa de Gaza, sendo considerado o maior comboio em um só dia desde o começo da guerra, mas o volume de ajuda ainda é insuficiente, segundo organizações em Gaza.
No último domingo (29), o papa Francisco reforçou o pedido de cessar-fogo, a abertura de corredores humanitários e a liberação de reféns pelo grupo armado Hamas. Artistas de diversos países assinam uma carta endereçada ao presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, pedindo apoio ao cessar-fogo imediato em Gaza. Entre eles, Jennifer Lopes, Ben Affleck, Cate Blanchett, Kirsten Dunst e Dua Lipa, que buscam sensibilizar o governo dos Estados Unidos, aliado de Israel.
No último sábado (28), multidões também foram às ruas em Londres, Istambul, Roma e diversas outras cidades do mundo pedindo o cessar-fogo na região. Até a data o número de mortos já passava de 7,650 em Gaza.
Nesse sentido, a dirigente aponta que o central nesse momento para todo o povo que vive na Faixa de Gaza é exigir um cessar-fogo e garantir a solidariedade a essa população, que sofre com as consequências da crise humanitária na região.
Solidariedade: um valor humanitário para o MST
A solidariedade é uma prática constante e que integra os valores do MST há quase 40 anos, muito praticada pelos Sem Terra durante a pandemia de Covid-19, em que foram doadas 9 mil toneladas de alimentos saudáveis, mais de 2,5 milhões de Marmitas Solidárias e 10 mil cestas básicas, entre o início da pandemia em 2020 e janeiro de 2023.
Também integram as práticas de solidariedade do MST o estabelecimento de parcerias e as relações humanitárias e coletivas, em torno de demandas e pautas comuns da classe trabalhadora em todo o mundo, brigadas internacionalistas de solidariedade mantidas pelo MST em outros países, entre elas está a Brigada Ghassan Kanafani, na Palestrina.
Gilmar Mauro, da direção nacional do Movimento, “solidariedade não é dar a sobra, solidariedade é partilhar!”. E é essa partilha e solidariedade, na forma de alimento, que nesse momento o MST estende para as famílias que são vítimas da crise humanitária na Faixa de Gaza.
Desde o ano de 2011, a cada dois anos, a Brigada de Solidariedade Ghassan Kanafani é organizada para participar da Campanha da Colheita da Azeitona na Palestina. A presença de organizações e entidades internacionais durante a colheita é essencial para evitar mais repressão por parte de Israel e para garantir que os palestinos tenham condições de colher os frutos de seu trabalho. As pessoas que integram essa Brigada passam um mês trabalhando com a União dos Comitês de Trabalho Agrícola (UAWC), o principal movimento camponês da Palestina, além de aprender e compartilhar conhecimentos sobre outras experiências de resistências políticas e organizacionais na Palestina.
O MST também possui brigada internacionalista no Haiti, denominada Brigada Jean-Jacques Dessalines, em parceria com os movimentos populares da Via Campesina e Alba Movimentos Sociais, a partir de 2009. Em solidariedade ao povo haitiano e em resposta à ocupação militar coordenada pelo exército brasileiro e promovida por meio da Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (Minustah).
No continente africano, o Movimento mantém a Brigada Internacionalista Samora Machel, atualmente na Zâmbia desde 2017, mas que já teve como base Moçambique e a África do Sul. A brigada presta homenagem ao revolucionário moçambicano que liderou a Guerra da Independência de Moçambique e foi o primeiro presidente após sua independência, em 1975.
Os militantes da brigada realizam trabalho no país, em parceria com o Partido Socialista da Zâmbia, nas áreas de educação, saúde popular, comunicação e agroecologia. Nos últimos dois anos, o foco de trabalho da Brigada tem sido a Campanha de Alfabetização e Agroecologia, que visa alfabetizar milhares de zambianos e zambianas no idioma oficial do país, o inglês, bem como promover práticas agroecológicas em localidades do interior. A brigada também possui atuação continental, desenvolvendo atividades e articulações políticas com outros países da região, como Moçambique, Zimbabué, África do Sul e Gana.
E o MST também está presenta na Venezuelana, por meio da Brigada Internacionalista Apolônio de Carvalho. A brigada possui militantes do MST no país há mais de dez anos, que contribuem com a Revolução Bolivariana, nas áreas de produção agroeológica, soberania alimentar, produção de sementes, trabalho cooperativo e formação política, além de manter intercâmbio de estudantes em medicina.
No país, também são estabelecidas articulações políticas com vários setores da sociedade venezuelana e do governo, na capital, Caracas. As ações de integração popular ocorrem em parceria com os movimentos camponeses, Ministério da Agricultura e o Ministério de Comunas da Venezuela. A iniciativa teve início em 2006, após a visita do ex-presidente Hugo Chávez a um assentamento do MST em Tapes, no Rio Grande do Sul.
Internacionalismo
Todas essas ações partem do princípio de internacionalismo, ou seja, a defesa a solidariedade e a cooperação entre os povos de diferentes países, especialmente os que sofrem com a opressão e a exploração do imperialismo. Esta é uma reflexão que vem de Che Guevara, que defendia a premissa de que “o jovem comunista não deve se limitar às fronteiras de um território”, mas deve se sentir responsável pela luta revolucionária em todo o mundo.
Assim, o MST reconhece que a luta pela reforma agrária no Brasil está inserida em um contexto global de resistência ao capitalismo e ao agronegócio. Um exemplo é a integração do MST à movimentos sociais de outros países, especialmente da América Latina, através de organizações como a Via Campesina e a ALBA. As brigadas citadas acima partem da solidariedade aos povos que enfrentam o colonialismo, o racismo, o patriarcado e o militarismo.
A doação inicial de 2 toneladas de alimentos para as vítimas da crise humanitária na Faixa de Gaza é apenas uma primeira medida de solidariedade emergencial ao povo palestino, que sofre com a ocupação israelense e o bloqueio econômico. A estimativa, segundo o Movimento, é doar mais 100 toneladas de alimentos para as vítimas, que serão enviadas por meio de organizações humanitárias internacionais e o Governo Federal, reafirmando o compromisso do MST na luta pela reforma agrária e no internacionalismo entre os povos.
Fernanda Alcântara/Página do MST