Menino pobre da Vila Matos (um dos bairros mais antigos da cidade), quando chegou para seu primeiro emprego na Rádio Clube de Dourados Marçal Filho costumava ficar com a boca salivando toda vez que a “tia da coxinha” chegava ao saguão da emissora para abastecer sua mais fiel clientela, e ele sem um tostão furado no bolso. Ontem, em vez de salivar ele lacrimejou de tanta emoção. Foi a parte mais interessante do que era para ser uma entrevista e acabou num rosário pelo tanto de desencontros motivados pela falta de comunicação entre dois velhos amigos e companheiros de microfone, já que o Marçal de agora, candidato a prefeito – sim, ele é candidato!, e este é o furo de reportagem – não tem nada de arrogante e presunçoso, como aqui colocado tantas vezes, apenas continuando o mesmo Marçal que de tão tímido tinha medo de pedir um salgado fiado.
Antes que reclamem de minhas divagações, para que o leitor não fique angustiado, Marçal Filho foi peremptório: “Sou candidato. Minha candidatura não tem retorno muito menos dono e vou ser o prefeito do povo de Dourados”. Isto, para antecipar-se ao direito de resposta pedido ao Contraponto-MS pelo deputado Zé Teixeira, a quem foi atribuído, no texto anterior, o pertencimento de sua candidatura. “Não sou pupilo de ninguém, a menina dos olhos do deputado sempre foi o Alan Guedes”, disse, no que pareceu uma tentativa de vincular o nome do mais temido “coronel” da política douradense ao prefeito.
O tão aguardado “alô você” foi um dia antes do cafezinho. Sim, além de todos os salamaleques, ele serviu cafezinho, e até água mineral, o que derruba também o mito de que Marçal é “mão-de-vaca”. A propósito, como bom repórter que sempre foi, trocou de posição na mesa para perguntar de onde tirei essa história de que a famosa “mala preta” para a campanha já estaria muito bem guardada num cofre do hotel mais estrelado da cidade. “Aqui, por enquanto, só tem para o cafezinho mesmo”, garantiu, num misto de ironia e sarcasmo, coisa em que também é um craque, mas, aí falando sério, reclamando uma barbaridade das dificuldades financeiras para tocar sua primeira campanha majoritária.
Talvez por imaginar que eu fosse chegar com a faca nos dentes, depois de um frio aperto de mãos (a despedida já foi com um emocionado abraço), antes mesmo que me sentasse Marçal quis saber por onde anda meu irmão Ézio Moreira (Vivaldo da Silva Melo), também seu colega de microfone na mesma Rádio Clube. E, para mostrar que não estava para briga, já foi logo incorporando ao que até ali parecia um monólogo o tipo de assunto que é a tônica de seus programas de rádio: “Me tira uma dúvida… quem era mesmo que comia a fulana? você ou o beltrano? (claro que não vou revelar detalhes de alcova desta memorável era do rádio; nós recém-saídos da adolescência), mas apenas para passar ao leitor o clima descontraído e saudosista deste antológico contraponto ontem na cobertura do prédio das Araras.
Como se vê, diante de um candidato com a agenda tão lotada, sobraria pouco tempo para falar de projetos políticos e administrativos, o que ficou combinado para uma próxima e breve ocasião. Mesmo assim, como bom candidato, Marçal Filho não perdeu a deixa, mandando um recado ao amigo do peito, mas adversário, Alan Guedes: “Do jeito que está é que não dá para continuar”, sem entrar nos detalhes de tudo aquilo que sempre criticou em seu programa de rádio e que, uma vez eleito, terá a obrigação de fazer diferente.
Disso, aliás, ele não tem dúvidas. E para isso, garante que vai se cercar dos melhores quadros, tendo como critério o interesse público, não o de amigos, correligionários ou partidos. “E o que não tiver aqui vou buscar fora”, garantiu, numa alusão a um de seus ídolos na política, o ex-prefeito José Elias Moreira, que, segundo ele, só conseguiu tirar Dourados da estagnação e fazer uma grande administração por que peitou os próprios correligionários.
Não. Ele não estava se referindo a Zé Teixeira, pelo aqui escrito no dia anterior. Disse que o deputado é só mais um dos grandes parceiros de seu projeto, da mesma forma o governador Eduardo Riedel e seu antecessor Reinaldo Azambuja, mas que a candidatura é um sonho antigo que ele sente que essa é a hora de ser transformado em realidade. Relembrou sua trajetória como vereador, deputado estadual e federal por quatro mandatos para dizer que nunca se sentiu tão preparado e com tanta vontade de ser prefeito como agora. “Aprendi, nesse tempo, a importância de se respeitar a fila da política”, disse, para justificar as vezes em que seu nome foi especulado, apenas, como provável candidato.
Finalmente, candidatando-se também a ser o político de referência para que a população da região da Grande Dourados volte a pensar grande, Marçal Filho contou uma historinha que dá bem a dimensão do que povoa sua mente. Mesmo admitindo um possível revés, por conhecer melhor que ninguém o terreno em que está pisando – “eleição é eleição –, mas convicto de que será o próximo prefeito de Dourados:
– “Depois assumir, interinamente, a cadeira de deputado federal, até que André Puccinelli disputasse a prefeitura de Campo Grande, quando fui tomar posse como titular recebi uma proposta indecorosa e desrespeitosa, para que cedesse a vaga ao segundo suplente, que era da capital, para que continuasse como vereador em Dourados, com a promessa de ser presidente da Câmara, já que por ser de Dourados não daria conta de ser deputado federal”.
Falou tudo o que os douradenses tanto almejam, há tantos anos.