O dólar à vista renovou o recorde histórico da cotação em relação ao real nesta segunda-feira. A moeda americana terminou o dia hoje cotado em R$ 6,0942, com alta de 0,99%. Isto, mesmo depois de duas intervenções do Banco Central no câmbio. A autoridade monetária fez dois leilões de dólares para aumentar a oferta no mercado de câmbio, um já programado desde sexta-feira, com oferta de US$ 3 bilhões, com compromisso de recompra (leilão de linha), e um à vista, sem garantia de recomprar, no total de US$ 1,6275 bilhão, no maior movimento de intervenção desde a pandemia, em 2020.
Mas as intervenções foram insuficientes para frear a alta da moeda, que segue repercutindo o peso da condução das contas públicas. Entre 31 moedas mais negociadas no mercado mundial, o real foi a que mais se desvalorizou na comparação com o dólar nesta segunda.
Apesar das injeções, as medidas não foram suficientes para arrefecer a apreciação da moeda americana, que voltou a alcançar um novo recorde. Segundo analistas, estes movimentos são mais comuns no fim do ano por conta da menor liquidez (oferta de dólares no mercado de câmbio) e pelo envio de remessas de dividendos de multinacionais para suas sedes no exterior.
‘Dominância fiscal’
Na visão de Daniel Miraglia, economista-chefe do Integral Group, a dinâmica de preços dos ativos reflete o início de um processo de dominância fiscal. Na semana passada, o Banco Central elevou a taxa básica de juros, a Selic, a 12,25% ao ano. E indicou que deve levar a taxa a 14,25% ao ano até março.
— Acho que o Brasil está próximo (da dominância), que é quando a política monetária perde efeito sobre a economia, que se torna menos sensível a juros. E é por isso que os preços estão se movendo dessa forma — diz Miraglia, afirmando que esse prenúncio é visto nos juros futuros negociados no mercado.
Nesta tarde, a taxa de depósito interfinanceiro (DI) previa uma taxa básica de juros alcançando os 16,5% no segundo semestre de 2025.
Desconfiança fiscal
A tramitação de projetos sobre o arcabouço fiscal e cortes de gastos públicos no Congresso também ajuda a pressionar o câmbio. Segundo Rodrigo Cabraitz, trader de câmbio da Principal Claritas, o ritmo (da votação no Congresso) pode pressionar a desidratação das medidas, diminuindo o real impacto que as medidas possam ter no Orçamento:
— A gente vê que há um esforço no campo legislativo para fazer as votações antes do fechamento da agenda de 2024, mas acho que o prazo acaba sendo muito curto para as discussões, ainda mais nessa complexidade — afirma.
Para Miraglia, as declarações do presidente Lula em entrevista ao Fantástico, da TV Globo, no domingo, afirmando que a taxa em 12% era “errada”, demonstram que o chefe do Executivo não tem dimensão do problema envolvendo o ritmo de gastos do governo:
— Leva o mercado a entender que o Executivo não entendeu o problema. Uma vez que ele não entendeu, ele não vai corrigir o problema, sem fazer nada com o fiscal, sem corte estrutural, culpando os juros e o mercado — pontua Miraglia, afirmando que as intervenções da autoridade monetária não são capazes de parar a alta no dólar por conta da “falta de mudança de sinalização do fundamento”.
Paulo Renato Nepomuceno/O Globo — Rio de Janeiro
