Acuado pela queda na pesquisa Quaest de avaliação do governo e pelas crises recentes (do Pix e da alta dos alimentos), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou a entrevista coletiva da manhã desta quinta-feira para tentar tirar o governo das cordas. Com base na estratégia definida pelo novo comando da Secretaria de Comunicação Social (Secom), o petista se expôs a perguntas de jornalistas de diferentes veículos por quase uma hora e meia.
Como resposta à força da oposição nas redes sociais, a equipe do novo ministro Sidônio Palmeira entende que Lula precisa falar mais para ocupar o noticiário e se opor aos ataques e notícias falsas. Ao longo desse terceiro mandato, os contatos mais diretos do presidente com jornalistas foram esporádicos em alguns cafés da manhã (que não acontecem há nove meses), poucas entrevistas para rádios e emissoras de televisão e coletivas dadas em viagens no exterior.
Logo no começo da sua fala nesta quinat-feira, Lula deixou explícita a nova estratégia ao se comprometer “a dar mais entrevistas e se colocar mais à disposição de vocês (jornalistas)”. O presidente contou que cogitou até a hipótese de seguir o modelo das “mañaneras” do ex-presidente mexicano López Obrador. Quando estava no poder, Obrador, único líder de esquerda do mundo a conquistar altos índices de popularidade recentemente, dava entrevistas diárias às 6h que se estendiam por até três horas. As “mañaneras” foram alvo de críticas, porém, por causa dos ataques do presidente mexicano a jornalistas e pela divulgação de notícias falsas. Lula disse que, após analisar o modelo, chegou à conclusão que a cultura brasileira não permitiria a sua adoção.
Nesta quinta-feira, o petista chegou para a entrevista com respostas preparadas para perguntas óbvias e com os principais recados que pretendia passar ensaiados. Sidônio acompanhou atentamente e, em muitos momentos, acenou com a cabeça concordando com a resposta dada pelo presidente. Lula elogiou de forma enfática e tentou prestigiar o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, chamado de “fraco” na véspera pelo presidente do PSD, Gilberto Kassab. Também procurou dar um ar de normalidade para a elevação da taxa Selic em um ponto pela nova direção do Banco Central, presidido pelo seu escolhido, Gabriel Galípolo, além de enfatizar a “autonomia” da instituição.
Em outro aceno ao mercado, o presidente disse que o governo não interfere no preço dos combustíveis e que a Petrobras poderia elevar o diesel sem comunicá-lo. Ao fim, as declarações de Lula ajudaram a conter a alta do dólar nesta quinta-feira, ao contrário do que aconteceu ao longo do ano passado, quando as falas do presidente fizeram a moeda americana disparar.
No início da entrevista, Lula também fez questão de entrar na comparação com o governo do antecessor, Jair Bolsonaro, ao dizer que o Estado estava desmontado quando tomou posse. O presidente, porém, não citou diretamente nenhuma vez o nome do adversário.
Tentou ainda a todo custo evitar falar de reforma ministerial, um assunto que pode melindrar partidos aliados. Em uma das vezes em que os jornalistas o perguntaram sobre o assunto, Lula usou a resposta para falar de equilíbrio fiscal. Lembrando que não havia respondido sobre as chances da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, virar ministra, elogiou a colega de partido, mas evitou se comprometer com a sua nomeação para a Secretaria-Geral.
Sérgio Roxo/O Globo