17h39, começo de fevereiro, inverno no hemisfério Norte. No pequeno e antigo porto da cidadezinha. Neblina ou garoa fina? Pouca visibilidade. Onde andam os marinheiros de outros tempos?
Ainda é dia, apesar de tudo, ainda há uma certa claridade. O céu, cor de chumbo, tem de um lado e de outro uma faixa mais clara, querendo chegar ao branco. Um casal com seu cachorro atravessa meu campo de visão.
Dentro do bar, outro casal, ainda de mantô, se prepara para partir após tomar seu café. Ou teria sido drinques, pela hora anterior ao jantar? Uma pessoa com fones de ouvido observa algo em seu telefone. Mas o que mais chama a atenção é um senhor com uma xícara de café à sua frente. Ele parece uma estátua, o olhar fixo em algum ponto distante. O que o incomoda? Que tristezas carrega?
A garçonete me esqueceu? Cadê o meu café?
As águas do mar sobem e desce… No tempo passado, quantos não passaram por este cais, com barcos cheios ou vazios de peixes? As trabalhadoras das indústrias da sardinha certamente passaram por aqui. Seus maridos, irmãos, filhos estavam no mar — na pesca — ou nos bares, embriagando-se para esquecer o medo que sentiam nas tempestades no alto mar?

Mazé Torquato Chotil – é jornalista e autora. Doutora (Paris VIII) e pós-doutora (EHESS), nasceu em Glória de Dourados-MS, morou em Osasco-SP e vive em Paris desde 1985. Tem 14 livros publicados (cinco em francês). Fazem parte deles: Na sombra do ipê e No Crepúsculo da vida (Patuá); Lembranças do sítio / Mon enfance dans le Mato Grosso; Lembranças da vila; Nascentes vivas para os povos Guarani, Kaiowá e Terenas; Maria d’Apparecida negroluminosa voz; e Na rota de traficantes de obras de arte.
Em Paris, trabalha na divulgação da cultura brasileira, sobretudo a literária. Foi editora da 00h00 (catálogo lusófono) e escreveu – e escreve – para a imprensa brasileira e sites europeus.