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quinta-feira, julho 17, 2025

Patriotas de bomba e bíblia: quando Trump fala da Casa Branca e Bolsonaro ouve no espelho

Dos céus do Irã às redes do Brasil, mísseis e postagens inflamam o mundo, enquanto “patriota” vira bala retórica — e quem sangra é a democracia

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Fui dormir esta madrugada estupefato com o discurso de Donald Trump, proferido poucas horas depois de ter ordenado o mais recente bombardeio americano ao Oriente Médio. As imagens dos B-2 lançando bombas sobre as instalações nucleares do Irã povoavam apenas as mentes aflitas, pois que nas telas, apenas o presidente dos Estados Unidos falava com a altivez de quem se vê como enviado divino — mesmo sem a autorização formal do Congresso para declarar guerra.

Hoje, os verdadeiros patriotas mostraram ao mundo que a América não se rende. Não pediremos desculpas por defender nossa pátria dos monstros do terror.

A retórica era antiga. A gravidade, renovada. O mundo, em estado de alerta.

Acordei ainda sob o impacto de tanta insanidade. Fiz o de sempre nas manhãs de domingo: tomei meu soco prates (como não lembrar dele, o sargento agora desembandeirado, nessas horas!) para descer dois “ovosquentados”, seguido de um café com leite — esse, mais para dissolver o pão integral de castanhas do que para me reconectar com a realidade.

Ato contínuo, me preparei para o ritual do Evangelho no Lar, essa espécie de escola dominical da Doutrina Espírita. E lá estava, como num improvável cruzamento entre algoritmos e mediunidade, a lição do dia: “Embainha tua espada.”

Sim, palavra por palavra, numa coincidente sequência cronológica, já na página 303 do livro O Evangelho por Emmanuel, nos comentários finais ao Evangelho segundo João, lia-se:

A guerra sempre foi o terror das nações. Furacão da inconsciência, abre a porta a todos os monstros da iniquidade por onde se manifesta. O que a civilização ergue ao preço de séculos laboriosos de suor, a guerra destrói com fúria de poucos dias.” No caso de Trump, com a fúria de poucas horas — e o alcance de um B-2 sobre o Oriente Médio.

A espada que fala inglês (e responde em português)

Enquanto Trump bombardeia o Irã em nome dos “patriotas”, do outro lado do hemisfério, Jair Bolsonaro ouve e repete. Mesmo inelegível e enrolado até o talo com a Justiça, não perdeu tempo: compartilhou o discurso americano, exaltou a coragem do aliado ianque, e voltou a pedir anistia aos “patriotas do 8 de janeiro”, como ele chama os vândalos que queriam quebrar a democracia com Bíblia na mão e Código Penal nas costas.

Esse diálogo transcontinental de horrores nos revela algo: a palavra “patriota” virou um instrumento bélico. E como todo instrumento em mãos erradas, ela deixa de construir para destruir.

A guerra contra o idioma

Antes de ser sequestrada por lunáticos armados, tal qual a bandeira brasileira, “patriota” era só uma palavra altiva. Designava aquele que ama a pátria, serve à sua gente, respeita a Constituição. Hoje virou bordão de extremista, senha de golpe, hashtag de desinformação.

Nos EUA, patriota é quem aplaude um bombardeio sem justificativa. No Brasil, é quem ataca o STF de verde e amarelo, apoiado por Telegram e fake news. No dicionário político de 2025, patriota virou disfarce de bárbaro.

Por isso, o ContrapontoMS fiel à sua missão etimológica e semântica, com seu saracurismo transcendental — com o aval de Emmanuel e do bom senso — sugere a necessária atualização do verbete.


patriota

[Do grego patriótes. Substantivo de dois gêneros.]

  1. Pessoa que já amou a pátria antes dela ser loteada por radicais.
  2. Nos EUA, alguém que confunde segurança nacional com espetáculo bélico.
  3. No Brasil, bolsonarista raiz que marcha em nome da liberdade sem saber soletrar “Estado Democrático de Direito”.
  4. Indivíduo que considera Alexandre de Moraes um agente da KGB e que o STF conspira com Pequim.
  5. Sinônimo de “gado com orgulho”.
  6. Palavra repetida em discursos autoritários para blindar canalhices com verniz patriótico.
  7. Figurado:
    a) Arma semiautomática de retórica extremista.
    b) Palavra em decomposição semântica.
    c) Meme com filtro de Brasília.
  8. Regionalismo pernambucano (1817): revolucionário.
  9. Gíria sulista (1893): soldado do governo.
  10. Bras. – Gíria popular: Mulher de seios muito grandes.
  11. Atualização 2025: Termo usado por líderes que têm pavor de livros e fetiche por quartéis.

Em resumo, enquanto Trump lança mísseis e Bolsonaro lança postagens, é a democracia que vai se refugiando no silêncio. E, ao final da lição espírita, ecoava ainda a voz de Emmanuel: “Lança a espada na bainha. Segue com Cristo, que é o Príncipe da Paz.

Mas no púlpito da Casa Branca, Cristo foi trocado pelo capeta com bonê “Make America Great Again” e seus generais. E na varanda de sua casa à margem do Lago Paranoá, em Brasília, um capitão saudoso do porão.

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