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sexta-feira, dezembro 5, 2025

Prisão de Bolsonaro tensiona negociação com os EUA

Revés processual do ex-presidente elevou a tensão política, mas não deve desengavetar projeto de anistia aos envolvidos no 8 de Janeiro

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Até pouco tempo atrás, Jair Bolsonaro era visto por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) como um bom réu no julgamento da trama golpista. Ele marcou presença nas sessões, evitou tumultuar o andamento do processo e até convidou, em tom de piada, o ministro Alexandre de Moraes para ser seu vice em 2026. O ex-presidente adotou essa postura pois vislumbrava a perspectiva de ter uma redução da pena, que pode chegar a 43 anos de prisão. Até que o cenário mudou. Em pouco tempo, o ex-capitão do Exército passou a usar tornozeleira eletrônica e teve a sua prisão domiciliar decretada. Agora, corre o risco de cumprir a sua eventual punição em regime fechado.

Essa reviravolta processual ocorreu porque o ministro Alexandre de Moraes entendeu que Bolsonaro estava atuando, por meio do seu filho Eduardo Bolsonaro, para coagir o STF. Desde quando deixou o Brasil para morar nos Estados Unidos, o deputado licenciado de São Paulo atuou para convencer o presidente americano Donald Trump a retaliar a Corte. A investida aloprada rendeu frutos e tornou Moraes o primeiro brasileiro a ser alvo da Lei Magnitsky, instrumento severo de sanções do governo americano impostas a acusados de violarem direitos humanos.

Se antes disso Moraes não reunia apoio majoritário para decretar a prisão do ex-presidente, pois alguns ministros do STF consideravam que a medida poderia se reverter em ataques contra a Corte, agora o magistrado aglutinou, por ora, maior respaldo dos seus colegas por ter colocado a sua cabeça a prêmio, sobretudo no governo Trump, ao bater de frente com bolsonaristas. Nos bastidores, alguns ministros têm dito que, se não for tracejado um limite para a atuação do ex-presidente e seus filhos, o cenário político do país poderá degringolar, polarizando ainda mais a disputa eleitoral em 2026.

De olho nesse tabuleiro, integrantes do Palácio do Planalto viram dois efeitos negativos na prisão domiciliar de Bolsonaro. O primeiro deles é o alinhamento dos candidatos da direita e da centro-direita no discurso de solidariedade ao ex-presidente. Os governadores Eduardo Leite (PSD-RS), Ratinho Jr. (PSD-PR), Ronaldo Caiado (União-GO), Romeu Zema (Novo-MG) e Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), que tentam se cacifar para herdar o espólio bolsonarista nas urnas em 2026, criticaram a escalada da crise e o “cabo de guerra jurídico-político”. “Não gosto da ideia de um ex-presidente não poder se manifestar, e gosto menos ainda de vê-lo ser preso por isso, antes ainda de ser julgado pelo órgão colegiado da Suprema Corte”, escreveu Leite em sua rede social.

O segundo efeito visto como negativo para o Planalto é um esperado tensionamento nas negociações com os Estados Unidos para reduzir o tarifaço de 50% imposto ao Brasil como medida de retaliação de Trump devido a uma suposta perseguição jurídica contra Bolsonaro. Nos últimos dias, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro Fernando Haddad, da Fazenda, viam uma fresta aberta na porta de entrada da Casa Branca para discutir os novos termos das relações comerciais entre os dois países. O próprio Trump ressaltou que poderia receber uma ligação de Lula.

No entanto, após a prisão domiciliar de Bolsonaro, o Escritório de Assuntos do Hemisfério Ocidental, órgão americano vinculado ao Departamento de Estado do governo americano, criticou a decisão de Moraes por usar “as instituições brasileiras para silenciar a oposição” e “impor ainda mais restrições à capacidade de Jair Bolsonaro de se defender publicamente”. Integrantes da Esplanada veem que será difícil o governo americano “tirar o fator Bolsonaro” da mesa de negociação do tarifaço e que será desafiador separar a questão política da econômica em contatos com a Casa Branca, pois Trump está interessado na volta do ex-presidente ao poder.

Apoiada nessa perspectiva, a oposição tem se planejado para dobrar a aposta contra o STF, acentuando o discurso de perseguição política e pressionando tanto pela votação de propostas que reduzam o poder de membros da Corte como pela votação da anistia dos envolvidos no 8 de janeiro. O projeto que sugere reverter a condenação de golpistas favoreceria não só o ex-presidente como também o seu filho Eduardo Bolsonaro.

Uma das investidas da oposição envolveria pautar o projeto de anistia na ausência do presidente da Câmara, Hugo Motta, ocasião em que o vice-presidente da Casa, deputado Altineu Côrtes (PL-RJ), assumiria o posto de comando. O próprio parlamentar verbalizou essa intenção em uma declaração pública nesta terça-feira. A outra frente de ataque seria paralisar as atividades do Congresso até que a absolvição dos envolvidos na trama golpista e no 8 de janeiro seja colocada em votação. Com isso, a votação da proposta que assegura isenção do Imposto de Renda para quem recebe até dois salários mínimos, uma proposta de campanha do presidente Lula, seria colocado à deriva.

Seja de um jeito ou de outro, essa insurreição tende a naufragar, porque tanto Motta como o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, têm dito nos bastidores que não vão se posicionar sobre a prisão domiciliar de Bolsonaro, porque não querem morder a isca da polarização. Embora os dois parlamentares reconheçam a importância da oposição para chegarem ao comando das duas Casas, eles têm reforçado que a escalada da crise não vai terminar bem para o país e que o momento é de reduzir a fervura, seguindo o conselho de Ulysses Guimarães: “Não se pode fazer política com o fígado, conservando o rancor e ressentimentos na geladeira”.

Thiago Bronzatto/O Globo — Brasília

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