20.8 C
Dourados
sexta-feira, dezembro 5, 2025

Dia de jogo

- Publicidade -

Estou exausta. Pensei que não chegaria nunca.
O ônibus que peguei para chegar ao metrô passava em frente ao estádio do São Paulo F.C., onde havia um jogo marcado para mais tarde, à noite. À noite! Ora, era apenas 13h quando passava por lá — e o trânsito já estava infernal.

O farol estava aberto, mas os carros não andavam. Para ver o que bloqueava a passagem, forcei o olhar e a cabeça para a direita. Vi bancas de comida já instaladas na rua. Como assim?! Estavam se preparando para o jogo mais tarde — barracas nas calçadas e até na rua!

E os fiscais, para ver aquilo? Estavam lá, tentando direcionar os carros que queriam entrar nas ruas transversais.

Ainda está tranquilo. Daqui a duas horas, ninguém mais passa por essa rua!
Ouvi uma voz lá do meio do ônibus.

Como assim?! Preparação em força. Bancas de comida com pernil já assado, pães para os sanduíches, linguiças grelhadas e outras ainda cruas, prontas para o fogo — uma banca atrás da outra. Tanta comida! E bebida! Para batalhões inteiros.

Nas esquinas adiante, barbantes ligavam dois postes. E neles, camisetas do time: de todos os tamanhos, modelos diferentes, mas com as mesmas cores predominantes — branco, preto e vermelho. Em outro ponto, um varal de bandeiras se balançava, sopradas pelo vento.

Fazia tempo que eu não via coisa igual.

O ônibus continuava avançando com dificuldade. Na montagem de uma das bancas de comida, três homens brincavam enquanto trabalhavam, como se fossem crianças. Passavam pacotes — que deviam conter copos de plástico — de um para o outro, lançados com leveza e risadas.

Imaginei a rua no dia seguinte, como se um furacão tivesse passado, deixando atrás de si tanto lixo no chão, produzido por um povo que, tantas vezes, esquece que é civilizado, que não vive sozinho na grande cidade — e que existem latas de lixo.

À esquerda, na leve subida da rua, uma velha pick-up tinha dificuldade em avançar, soltando fumaça pelo escapamento. Devia ser um novo “feirante” chegando.

O metrô não estava longe. O ônibus avançava com esforço. À esquerda, em frente a um laboratório médico, uma senhora com um grande envelope tentava atravessar a rua. Os carros estavam quase parados, mas, ao ouvir o barulho de motos acelerando, ela não ousou atravessar naquele ponto. Virou à esquerda e desceu a rua, na esperança de encontrar um farol fechado mais adiante.

  • Mazé Torquato Chotil – Jornalista e autora. Doutora (Paris VIII) e pós-doutora (EHESS), nasceu em Glória de Dourados-MS, morou em Osasco-SP antes de chegar em Paris em 1985. Agora vive entre Paris, São Paulo e o Mato Grosso do Sul. Tem 14 livros publicados (cinco em francês). Fazem parte deles: Na sombra do ipê e No Crepúsculo da vida (Patuá); Lembranças do sítio / Mon enfance dans le Mato Grosso; Lembranças da vila; Nascentes vivas para os povos Guarani, Kaiowá e Terenas; Maria d’Apparecida negroluminosa voz; e Na rota de traficantes de obras de arte.
    Em Paris, trabalha na divulgação da cultura brasileira, sobretudo a literária. Foi editora da 00h00 (catálogo lusófono) e é fundadora da UEELP – União Européia de escritores de língua Portuguesa. Escreveu – e escreve – para a imprensa brasileira e sites europeus.
- Publicidade -
- Publicidade -
- Publicidade -

Últimas Notícias

Últimas Notícias

- Publicidade-