Foi a primeira vez na história de Dourados que o Papai Noel desceu de rapel da torre da Catedral Imaculada Conceição. E, claro, isso só poderia acontecer no “Natal Encantado” de “Marçal Noel” — um espetáculo que começou nas alturas e terminou onde sempre deveria terminar: no chão batido da Comunidade Vitória, ao lado das crianças que raramente são lembradas pelo poder público.
Nada que surpreenda quem acompanha Marçal no rádio por décadas, especialmente aos domingos, quando, ao final do programa, o apresentador sai para entregar bolos pela cidade afora, visitando ouvintes como quem visita velhos amigos. Desde sempre, uma prévia do que veríamos agora: o prefeito que não espera o povo vir até ele — ele é que vai até o povo.
Foi assim no último fim de semana, na Comunidade Vitória, nos fundões das Sitiocas Campo Belo, onde cerca de 200 crianças ganharam o que muitas nunca tiveram: um Natal lembrado pelo poder público. Não foi tubulação nova, não foi pavimentação, não foi obra de impacto. Foi brinquedo. Simples. Colorido. Barato. Transformador.
A Guarda Municipal — em sua grande maioria de folga — deixou o descanso de lado para entregar 250 brinquedos arrecadados na campanha “Sorrisos de Natal”. E entregaram com brilho no olho. Com o mesmo brilho que escapou das mães, emocionadas ao ver os filhos segurando o presente que elas, neste ano, não poderiam dar.
E lá estava Marçal, de gorro vermelho, subindo na carroceria da viatura. Não precisou anunciar. Para boa parte das crianças, era apenas um homem alegre distribuindo brinquedos. Mas bastou soltar um “ALÔ VOCÊ!!!” para todas reconhecerem que aquele senhor era o prefeito.
Uma menina de sete anos, desconfiada, perguntou:
— “Você é o Marçal Filho?”
Ele respondeu:
— “Sou sim! Desde pequenininho. E se aparecer outro por aqui, é falso — manda prender”, disse, repetindo um dos bordões de seu programa de rádio.
As crianças gargalharam como quem entende a piada e, ao mesmo tempo, o poder simbólico de um prefeito que se coloca ao alcance da mão delas.
A notícia correu mais rápido que conexão de fibra. Em minutos, moradores saíam das casas — muitas improvisadas, algumas com porta, outras sem — para ver o prefeito e a Guarda distribuindo brinquedos como quem distribui dignidade.
Uma diarista, Jaine, disse entre lágrimas: “Comprar brinquedo ou comprar comida?”
“Tive que escolher.”
Outra moradora, Sara, completou: “Nunca prefeito nenhum passou aqui depois de eleito.”
E este é, talvez, o ponto mais forte da história: não era campanha. Não era promessa.
Era presença.
Pode não resolver tudo — e não resolve mesmo. A comunidade continua precisando de saneamento, moradia digna, regularização fundiária, segurança e oportunidades. Mas naquele momento — naquele pequeno instante de alegria infantil — a cidade entendeu que política também é gesto. Também é olhar. Também é aparecer onde ninguém aparece.
A dona de casa Sandra Helena disse: “Nunca pensei que a Guarda fosse se preocupar com nossas crianças.”
E a grávida de gêmeos, Ana Kesia, completou: “A gente ganha para comer. Nunca sobra para brinquedo.”
Marçal ouviu tudo isso. Com o gorro vermelho sendo puxado pelo vento, ele ouviu. E é aí que entra o sentido maior da cena: não era o prefeito que distribuía brinquedos — eram as crianças que distribuíam humanidade.
O prefeito que fez o Papai Noel desder de rapel na igreja agora descia, ele, ao chão duro da periferia. O radialista que entregava bolos agora entregava brinquedos. O prefeito que governa com planilhas, reuniões e decretos agora governava com a palavra mais antiga do Natal: presença.
E, neste primeiro sábado de dezembro, pelo menos na Comunidade Vitória, o Papai Noel era douradense, tinha microfone na alma e dizia:
“Alô você!!!”, como quem diz: “Eu sei que vocês existem — e é por isso que eu vim.”
ContrapontoMS, com informações da Assecom/PMD
