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quinta-feira, dezembro 18, 2025

Ligações perigosas: comandos criminosos, poder político e o silêncio constrangedor do TJMS

Prisões no Rio, operações em Mato Grosso do Sul e casos locais reacendem o debate sobre conexões entre facções, política e decisões judiciais seletivas — quando o silêncio institucional deixa de ser prudência e passa a ser parte do problema

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Se a moda pega — e tudo indica que está pegando — Mato Grosso do Sul talvez tenha chegado àquele momento incômodo em que o espelho devolve uma imagem que muitos preferem não enxergar. A prisão, no Rio de Janeiro, de um desembargador acusado de vazar informações sigilosas para favorecer o crime organizado não é apenas um fato isolado fora do eixo MS. É um alerta. E dos mais barulhentos.

Aqui no ContrapontoMS, há anos se chama atenção para a relação promíscua — sim, promíscua — entre o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul e seus lindeiros do Parque dos Poderes. Uma convivência que, sob o manto da institucionalidade, frequentemente descamba para a blindagem seletiva. No MS, políticos poderosos quase nunca perdem. Quando perdem, recorrem. Quando deveriam ser presos, aguardam. Quando deveriam explicar, silenciam. E quando deveriam cair, seguem dando as cartas, como agora, com vistas às eleições de 2026.

O caso do deputado estadual Neno Razuk é apenas mais um capítulo de um roteiro conhecido. Seu pai e irmãos foram presos recentemente em Dourados por práticas que, segundo os próprios autos, não começaram ontem, nem anteontem, mas remontam ao final da década de 1970. A pergunta que não quer calar: por que agora? O mesmo deputado teve pedido de prisão preventiva engavetado no TJMS, sem alarde, sem pressa, sem constrangimento.

Seu primo e colega de Assembleia, Jamilson Name — sobrenome que carrega história e simbologia suficientes — vive situação semelhante. Integra a chamada “bancada do bicho”, responde por crimes conhecidos e, ainda assim, permanece fora da cadeia. Pior, circulando, leve e solto, pelos corredores e no plenário da ALMS. E não se trata de exceção. Há gente mais poderosa, mais antiga e mais influente que segue intocável, como se a lei tivesse endereço certo e CEP seletivo.

Mato Grosso do Sul não pode fingir surpresa. O Estado já viveu, não faz tanto tempo, o constrangimento de ver desembargadores sob investigação, afastados e até monitorados. O episódio envolvendo o então presidente do Tribunal de Justiça, Sérgio Fernandes Martins, que chegou a usar tornozeleira eletrônica, deveria ter servido como marco de inflexão. Não serviu. Passou. Foi empurrado para debaixo do tapete institucional, como se fosse um acidente de percurso, e não um sintoma grave.

Agora, a Operação Unha e Carne 2, da Polícia Federal, joga luz sobre um modelo que não é exclusivo do Rio de Janeiro. A prisão do desembargador Macário Judice Neto, relator de um processo envolvendo o ex-deputado TH Joias e suas ligações com o Comando Vermelho, escancara algo ainda mais perturbador: o reaproveitamento institucional de magistrados com histórico problemático, afastados por anos, que retornam, são promovidos e voltam a decidir sobre casos sensíveis.

Macário esteve afastado por 17 anos, desde 2005, por denúncias do Ministério Público Federal relacionadas à venda de sentenças quando atuava no Espírito Santo. Em 2023, voltou. Em 2024, virou desembargador. Em 2025, está preso. O detalhe que fecha o círculo: sua esposa atuava na Assembleia Legislativa do Rio até poucas semanas atrás, enquanto a investigação já avançava. Unha e carne, como batizou a PF. Nome perfeito.

Se isso acontece no TRF-2, por que não aconteceria em outras cortes? Se a porta foi arrombada no Rio às seis da manhã, não há garantia alguma de que ela não possa ser arrombada em Campo Grande. A sensação de intocabilidade costuma durar exatamente até esse momento.

Talvez tenha chegado a hora de o TJMS parar de se indignar com reportagens e começar a se preocupar com seus próprios silêncios. Porque quando decisões judiciais passam a ser previsíveis não pelo Direito, mas pelo sobrenome do réu; quando prisões preventivas desaparecem sem explicação; quando processos andam em velocidade diferente conforme o peso político do acusado, o problema deixa de ser pontual e passa a ser estrutural.

E convém deixar claro: o paralelo com o que aconteceu ontem no Rio de Janeiro não é gratuito nem aleatório. Assim como não foi aleatória a operação que recentemente encrencou a vida do deputado Neno Razuk e de seus familiares. O que começa a emergir, ainda que timidamente, é a conexão entre organizações criminosas que atuam em rede — o Comando Vermelho do Rio e suas sucursais espalhadas pelo país, inclusive em Mato Grosso do Sul. Quando essas conexões passam a incomodar interesses políticos e institucionais, a engrenagem se move. É exatamente nesse ponto que, como diria o saudoso Manoel Eletricista, “aí é que surge o pobrema”. Porque quando o crime organizado cruza com a política, e a política cruza com decisões judiciais seletivas, não há coincidência possível — há apenas consequências adiadas.

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