A proposta apresentada pelo deputado Zé Teixeira, de utilizar mão de obra prisional na reforma e manutenção de escolas públicas, parte de um princípio difícil de contestar: o da ressocialização por meio do trabalho. Em tese, trata-se de uma boa intenção, já testada em outros programas e defendida por especialistas como uma forma de reduzir a reincidência criminal, oferecer qualificação profissional e, ao mesmo tempo, gerar economia aos cofres públicos.
O problema é que, entre a boa intenção e a política pública bem-sucedida, existe uma linha tênue — e perigosa — que não pode ser ignorada.
Escolas não são prédios quaisquer. São espaços sensíveis, frequentados diariamente por crianças, adolescentes, professores e servidores. Introduzir mão de obra prisional nesse ambiente exige mais do que discursos bem-intencionados. Exige critérios rigorosos, protocolos claros, fiscalização permanente e, sobretudo, transparência absoluta sobre quem são os detentos selecionados, quais crimes cometeram, qual o grau de risco que representam e sob quais condições estarão circulando nesses espaços.
Não se trata de preconceito, mas de responsabilidade. A sociedade tem o direito de saber se haverá distinção entre presos em regime fechado, semiaberto ou aberto; se haverá exclusão de condenados por determinados tipos de crime; se o acompanhamento será contínuo ou apenas formal; e se as comunidades escolares serão previamente ouvidas. Ignorar essas perguntas é abrir espaço para desconfiança, resistência e, no pior cenário, para tragédias anunciadas.
Outro ponto delicado diz respeito ao uso da mão de obra prisional como solução para problemas estruturais crônicos. Quando o Estado passa a depender sistematicamente de presos para executar serviços básicos, surge o risco de se criar um modelo que substitui investimentos regulares, concursos públicos e contratos transparentes por uma força de trabalho barata, com poucos direitos e baixo poder de questionamento. Ressocialização não pode virar atalho administrativo.
Há ainda o aspecto simbólico. Ao levar presos para dentro de escolas, o poder público precisa cuidar para que a mensagem transmitida não seja ambígua ou mal interpretada, especialmente por crianças e adolescentes. O discurso pedagógico da ressocialização precisa ser acompanhado de ações educativas claras, sob pena de o projeto produzir mais ruído do que aprendizado.
Nada disso invalida a proposta de saída. Mas deixa claro que ela não pode ser tratada como solução simples para um problema complexo. Se for feita com pressa, improviso ou opacidade, a iniciativa corre o risco de naufragar politicamente e socialmente. Se for construída com critérios objetivos, controle rigoroso e diálogo com a sociedade, pode se transformar em política pública responsável e eficaz.
Entre a boa intenção e o desastre, a diferença costuma estar nos detalhes. E, neste caso, os detalhes não podem ser tratados como burocracia menor. São eles que definirão se o projeto será lembrado como inovação social ou como um erro que poderia ter sido evitado.
