Volto ao tema a respeito do compadrio entre os Poderes do Parque famoso sem medo de sofrer qualquer tipo de reprimenda do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Não por suposta proximidade pessoal com magistrados — ainda que conheça, desde guri, o desembargador Jairo Roberto Quadros, ou tenha laços familiares com o desembargador Eduardo Machado Rocha, aquele que, quando juiz, dizia sentir vergonha da própria carteira funcional diante do que via e do que sabia. Minha tranquilidade vem de outro lugar.
Ela nasce da arrogância institucional que o próprio TJMS já exibiu em público, personificada, em tempos recentes, pelo então presidente da Corte, Sérgio Martins Sobrinho — o mesmo que, anos depois, experimentaria o constrangimento de usar tornozeleira eletrônica, símbolo inequívoco de um sistema que por muito tempo se julgou acima de qualquer suspeita.
Recordo-me bem de um julgamento em que este jornalista figurava como réu em ação movida por um figurão da política matogrossulense. Sérgio Fernandes Martins, que presidia o julgamento — nomeado desembargador após ter sido procurador jurídico da Prefeitura de Campo Grande na gestão de André Puccinelli — declarou, sem qualquer pudor, que não daria seguimento à causa porque se tratava de um “bloguezinho” inofensivo de Dourados. A frase não era apenas desprezo profissional; era a tradução oral de uma cultura institucional: a certeza de que alguns falam de cima e outros devem permanecer calados.
Se não houve consideração pelo profissional mais antigo do jornalismo em atividade no Estado, que ao menos houvesse respeito pela cidade onde exerço a profissão há décadas — terra que também é berço do desembargador, cujo pai, também desembargador, Sérgio Martins Sobrinho, era representante de tradicional família, cujos próceres militavam na antiga e marvada UDN, legenda que deu sustentação civil ao golpe militar de 1964 e cuja herança autoritária ainda ecoa nesses tempos de recidiva golpista com o rótulo de bolsonarismo.
Esse pano de fundo ajuda a compreender por que o paralelo com o que ocorreu recentemente no Rio de Janeiro não é gratuito. A prisão de um desembargador acusado de vazar informações para favorecer o crime organizado não surge no vácuo. Tampouco foi aleatória a operação que encrencou a vida do deputado estadual Neno Razuk e de seus familiares em Mato Grosso do Sul. O que começa a emergir é a atuação de organizações criminosas em rede — o Comando Vermelho do Rio e suas sucursais espalhadas pelo país, inclusive em território matogrossulense.
Quando essas conexões passam a incomodar interesses políticos e institucionais, a engrenagem se move. Quando não incomodam, o silêncio prevalece. “É aí que surge o pobrema”, como diria meu saudoso sogro Manoel Eletricista.
O silêncio do TJMS diante de fatos graves, de decisões seletivas e de padrões que se repetem não pode mais ser tratado como prudência institucional. Silêncio reiterado, em ambientes contaminados por relações promíscuas entre poder político, econômico e judicial, deixa de ser neutralidade. Passa a ser método. E método, em democracia, também é escolha.
