Ao final de um processo judicial marcado por atrasos e pedidos de revisão, o presidente eleito dos EUA, Donald Trump, foi sentenciado nesta sexta-feira a uma pena de “liberação incondicional” pelo caso criminal envolvendo a fraude contábil para encobrir o pagamento de suborno à ex-atriz pornô Stormy Daniels. A penalidade, que não impõe multa, prisão ou liberdade condicional, essencialmente tem uma dimensão simbólica, ao encerrar o caso com um reconhecimento de culpa. Considerado culpado em 34 acusações por um júri popular em maio, Trump será o primeiro criminoso sentenciado a chegar à Casa Branca, quando assumir a Presidência americana no dia 20 de janeiro.
O juiz Juan Merchan, que presidiu o julgamento do republicano no Tribunal Distrital de Manhattan, já havia antecipado que o presidente eleito não seria sentenciado a cumprir pena de prisão, considerando a “conjuntura” — uma vez que, quando era réu, Trump era um ex-presidente, enquanto, agora, está prestes a assumir o principal cargo político do país. Ele detalhou o argumento durante a sessão desta quinta-feira, explicando que o cargo de presidente carrega consigo um “mandato legal”, mas que isso não diminui a seriedade do veredito do júri.
Trump participou da sessão por videoconferência, de sua mansão em Mar-a-Lago, na Flórida. Em um breve pronunciamento antes da leitura da sentença pelo juiz, o presidente eleito voltou a se declarar inocente no caso e a se referir a todo o processo como uma “caça às bruxas” e uma “experiência terrível”.
— Acho que foi um retrocesso para Nova York e para o sistema judiciário de Nova York — disse Trump, que também atacou seu ex-advogado Michael Cohen, um dos envolvidos no pagamento do suborno à ex-atriz pornô e testemunha-chave no caso, chamando-o de “sem credibilidade”.
Apoiadores e opositores do presidente protestaram em frente ao tribunal. Dentro da Corte, o ambiente foi descrito por jornalistas como “mais vazio” em comparação ao julgamento realizado em maio. Antes da leitura da sentença e da manifestação de Trump, o promotor Joshua Steinglass, da equipe jurídica que processou o então ex-presidente, concordou com a pena imposta e aproveitou o momento aberto à declarações para criticar o republicano por ter agido para minar o veredito apresentado pelo júri, classificando como ataques “infundados” e “implacáveis”.
— Este réu causou danos duradouros à percepção pública do sistema de justiça criminal e colocou os oficiais do tribunal em perigo — disse Steinglass, que acrescentou que Trump “está longe de expressar qualquer tipo de remorso” por sua conduta criminosa.
Apesar da sentença branda, Trump usou todos os meios legais para evitar que fosse proferida. Os advogados do presidente eleito apresentaram uma série de pedidos no Tribunal Estadual de Nova York para interromper o processo, sem sucesso, recorrendo em uma última tentativa à Suprema Corte, sob argumento de que a imunidade concedida ao presidente em exercício deveria ser estendida a um presidente eleito para “evitar graves injustiças e danos à instituição da Presidência e às operações do governo federal”. Na noite de quinta-feira, cinco dos nove ministros da Corte rejeitaram o recurso.
O máximo que a equipe jurídica de Trump conseguiu foi postergar a sentença, que acaba proferida dez dias antes de sua posse. Uma primeira leitura, agendada para julho, foi bloqueada por um recurso do republicano, ao passo que o próprio juiz Merchan postergou uma segunda data, em setembro, para não interferir na campanha presidencial. Após a eleição, uma terceira audiência marcada para 26 de novembro foi adiada, enquanto o presidente eleito e os promotores de Manhattan discutiam sobre como proceder na situação sem precedentes.
Os advogados de Trump agora podem apresentar uma declaração indicando sua intenção de apelar, e posteriormente apresentar um recurso Divisão de Apelações do Estado de Nova York em Manhattan.
Ao contrário de outros três casos criminais pendentes contra Trump, incluindo os relacionados às tentativas do presidente de reverter os resultados das eleições de 2020, Trump não poderá absolver a si mesmo na condenação por fraude fiscal após assumir a Presidência. Ao contrário de casos que correm em nível federal, condenações estaduais não são alcançadas pelo instituto do perdão presidencial.
Entenda o caso
Trump foi considerado culpado de 34 acusações relacionadas falsificações feitas para ocultar um suborno pago à ex-atriz pornô Stormy Daniels, com quem o magnata teria tido um caso em 2006 — mesmo após ser considerado culpado, ele nega que o relacionamento tenha ocorrido. Os pagamentos foram negociados durante a campanha presidencial de 2016, para um vazamento que pudesse prejudicar suas pretensões eleitorais.
Em nome do magnata, seu então advogado pessoal Michael Cohen pagou US$ 130 mil dólares (cerca de R$ 415 mil na cotação da época) do seu próprio bolso para comprar o silêncio da ex-atriz pornô, declarando essa quantia como despesas legais. Pelo valor pago para comprar o silêncio de Daniels, Cohen recebeu US$ 420 mil de Trump e do diretor financeiro da Organização Trump, Allen Weisselberg. O valor teria sido negociado em uma reunião entre os três dias antes da posse, em 2017. (Com AFP e NYT).
O Globo, com agências internacionais — Nova York