O grande enigma que ronda a política de Mato Grosso do Sul em 2026 não é o terno que Murilo Zauith já teria encomendado em Ribeirão Preto, nem mesmo o suplício de imaginar o ex-vice-governador ocupando uma cadeira no Senado (na vaga que Reinaldo Azambuja deixaria em 2030 para tentar retornar ao governo) sem enfrentar o veredito das urnas. O mistério maior está no comportamento do criador, Azambuja, sem a chave do cofre, e de sua criatura mais ilustre, o atual governador Eduardo Riedel.
Fontes bem plantadas no Parque dos Poderes garantem ao ContrapontoMS que, longe de ser um poste fincado na invernada de Azambuja em Maracaju, terra da linguiça e da política de curral, Riedel tem dado mostras de independência, fazendo ouvidos moucos às ordens que ainda ecoam das fazendas e do entorno azambujiano na capital. O roteiro da ruptura está escrito — e, quando as cortinas se abrirem, a peça terá título conhecido: “Crônica de um rompimento (aqui) anunciado”.
Se eleito senador, Azambuja consagrará sua volta ao palco central, mas dará, ao mesmo tempo, a senha para que Riedel inicie o governo que sempre sonhou chamar de seu. Até lá, criador e criatura encenam, cada um a seu modo, um teatro de conveniências: Azambuja, pela experiência de estrada, sabe disfarçar melhor; Riedel, impaciente como um dos mais bem-sucedidos empresários do agro, mal tolera a dramaturgia.
E é nesse cenário que reaparece Murilo Zauith, personagem sempre disposto a roubar a cena. Em 2022, tentou o golpe de mestre contra o próprio Azambuja, ensaiando uma rasteira para assumir o governo antes da hora. Agora, sonha ser suplente do mesmo Azambuja, num segundo casamento político que desafia até a imaginação dos roteiristas do Pantanal. O alfaiate de Ribeirão Preto pode até caprichar no corte, mas quem veste o figurino dessa tragicomédia é a política paroquial sul-mato-grossense — com seus enredos de autofagia, ressentimentos mal digeridos e ambições embaladas ao som e nos passos do chamamé e da linguiça de Maracaju.
O cálculo de Azambuja é simples: na esteira da eleição de Riedel, plantar outro poste — agora no Senado da República. Mas esse combo do criador e sua criatura dificilmente seria aceito de bom grado. Barbosinha, por exemplo, não esconde a ambição: quer ser senador, claro, desde que não emplaque uma recandidatura a vice — posição confortável para quem nunca deixa de estar na boca do palco. Já Nelsinho Trad, o eterno caixeiro-viajante, aposta menos no prometido apoio de Azambuja e Riedel e muito mais nos prefeitos cujos cofres andam abarrotados de emendas parlamentares, distribuídas com a destreza de mascate em feira. Isto, quando o assunto é a segunda vaga para o Senado, porque, para temperar ainda mais a autofagia paroquial, Murilo Zauith acena para Rose Modesto com seu nome, de novo, para o governo, numa tentativa de reescrever o roteiro e embaralhar as cartas antes mesmo da peça estrear.
É nesse ambiente de intrigas, ressurgindo mais como assombração do que como fênix, que o dono da um dia poderosa Unigran tenta alinhavar seu terno de suplente. Mas a movimentação pode ter efeito colateral: patrocinar uma terceira via pode embaralhar não só a eventual candidatura senatorial de Jaime Verruk, como também o próprio projeto Riedel-azambujista.
Interessante é que depois de abandonar hábito do ócio contemplativo panguando na padaria do fuxico da rua Cuiabá, Murilo Zauith descobriu outras tonalidades e uma correnteza mais forte das águas do Rio Brilhante — que corta suas terras — acreditando que elas podem muito bem desviar o curso e desaguar na Represa de Jupiá, em Três Lagoas, soprando ventos favoráveis para a ministra Simone Tebet. No caso, um voo alternativo de retorno ao Parque dos Poderes, onde já foi coadjuvante de André Puccinelli, ou até mesmo um pouso direto no heliponto da Praça dos Três Poderes, para subir, de novo, a rampa do Senado.
No fim, a cena que se desenha é a de uma província dividida entre criador e criatura, entre suplentes de ontem e protagonistas de amanhã, entre linguiça de Maracaju e águas do Brilhante. A pergunta que fica não é se haverá rompimento, mas quando — e com qual dos atores principais a plateia sul-mato-grossense decidirá aplaudir de pé. Como diria o detetive famoso, Sherlock Holmes: Elementar meu caro Watson!
