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sexta-feira, dezembro 5, 2025

A política segundo o violeiro

Almir Sater ensina que o Brasil precisa menos de discursos e mais de estrada. Andar devagar, afinal, também é uma forma de chegar

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Ando devagar porque já tive pressa… até porque meu cardiologista me deu um ultimato, daí o refúgio compulsório de dez dias na paradisíaca João Pessoa, capital da Paraíba. Uma receita que repasso aos colegas de lida e, principalmente, aos políticos, até porque só a serenidade dessas horas, no ócio contemplativo, para entender melhor a cobrança da fatura do tempo. E foi lá, entre um mergulho no mar e uma água de coco que me espelhei no conterrâneo Almir Sater, com sua voz mansa e firme como o correr de um rio, melhor que ninguém cantando o que o Brasil político esqueceu de ouvir: que não há atalho pra quem carrega verdade.

Nos tempos de grito e hashtag, Almir é quase uma afronta. Enquanto a política se debate nas massas, ele fala das maçãs — e não há metáfora mais perfeita. As massas, apressadas, querem tudo pra ontem. As maçãs, maduras, só acontecem se o tempo e o sol colaborarem. Na política, temos excesso da primeira e escassez da segunda.

O violeiro, que anda entre o Pantanal e a selva de pedra, divide-se entre seu refúgio em Rio Negro, onde a natureza ainda tem palavra, e as idas a Campo Grande e São Paulo, para cumprir compromissos com gravadoras e shows Brasil afora. De um lado, o silêncio do mato e o compasso das águas; do outro, o ruído urbano e o aplauso rápido. É nesse vaivém que Almir Sater equilibra o homem e o artista — o que ouve o som da viola e o que enfrenta o som do país.

E como se os algoritmos dos deuses da música fossem mais caprichosos do que os interesses das gravadoras, o destino tratou de puxar outro fio poético: Renato Teixeira, parceiro de primeira hora de Almir — aquele mesmo que, no melhor estilo Greta Garbo, “quem diria, foi parar no Irajá” — veio parar justamente em Dourados. Sim, porque Renato Teixeira mora também em Dourados, num condomínio lindeiro à Reserva Indígena do Jaguapiru. De um lado, o conforto urbano; do outro, a ancestralidade que resiste. Entre eles, um muro — o mesmo muro simbólico que separa o país que canta o campo daquele que finge entender o sertão.

É curioso como as canções parecem prever os caminhos do país. Enquanto Almir canta “cada um de nós compõe a sua história e cada ser em si carrega o dom de ser capaz e ser feliz”, a política parece insistir em desafinar a melodia coletiva. O violeiro é o anti-populista por natureza: não promete, entoa; não faz discurso, conta causos. E talvez fosse essa simplicidade o antídoto pra arrogância institucional que nos governa: menos slogan, mais chão.

Na lógica do berrante, quem toca alto demais espanta o gado. Na lógica do poder, quem grita mais alto ganha manchete. E é por isso que a política brasileira parece um rodeio de egos, sem peão de fé nem boi manso.

Enquanto isso, o violeiro segue, devagar. Vê a poeira baixar antes de dizer qualquer coisa.
Não chama o povo de “massa”, porque sabe que massa se molda. Prefere as maçãs — porque, quando apodrecem, a gente sente o cheiro.

Ando devagar porque já tive pressa”, canta Almir. E talvez o país precise aprender o mesmo compasso: andar menos por impulso e mais por rumo. Esperar o som certo da viola antes de aplaudir o berrante errado.

Afinal, no fim de tudo, a política — segundo o violeiro — não é palco, nem palanque.
É estrada. E quem corre demais acaba levantando poeira, mas nunca chega aonde devia.

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