A prisão de Jair Bolsonaro, decretada preventivamente no último sábado e tornada definitiva nesta terça-feira, provocou reações no campo da direita. Em poucas horas, grupos de WhatsApp de deputados, assessores e dirigentes do PL passaram a registrar um movimento típico de momentos de vácuo de liderança: perguntas sobre o futuro imediato, sondagens informais e conversas sobre “quem fala pelo grupo” — e até onde cada liderança poderia ir.
A família, porém, agiu antes que essa reorganização ganhasse corpo. Entre sábado à noite e segunda-feira de manhã, o clã Bolsonaro montou uma operação para impedir que o momento de fragilidade do ex-presidente abrisse espaço para reposicionamentos prematuros. A ordem, explícita nos recados públicos e reiterada nas conversas privadas, foi congelar qualquer discussão sobre 2026.
A irritação com conversas eleitorais se tornou pública a partir de uma postagem de Carlos Bolsonaro.
“Discutir sucessão presidencial enquanto os maiores absurdos políticos se acumulam contra o maior líder do país, e enquanto heróis nacionais são presos de forma ilegal, é compactuar com a covardia e a tortura”, escreveu o vereador.
A fala foi lida como um recado ao campo político inteiro — e um aviso direto aos governadores que vinham sendo citados como alternativas para a sucessão.
Enquanto Carlos adotou o tom mais duro, Flávio Bolsonaro assumiu a função de articulação. Desde sábado, segundo aliados, o senador tem repetido que não é o momento de tratar de 2026, num movimento destinado a proteger o capital político do pai e evitar que nomes externos se cacifem.
Questionado, Flávio reforçou a posição:
— Temos vários candidatos que estão competitivos, caso não possa ser o presidente Bolsonaro. Vamos deixar para ouvir isso da boca do presidente Bolsonaro, no momento em que ele achar melhor.
Apelo de Michelle
A reunião de segunda-feira na sede do PL foi descrita por participantes como a mais tensa desde 2022. Michelle Bolsonaro chegou acompanhada de assessores próximos e, segundo relatos, estava visivelmente abalada.
Durante o encontro, pediu a palavra para fazer um apelo: que ninguém tratasse ainda das eleições e que o foco fosse exclusivamente o momento jurídico de Bolsonaro. A ex-primeira-dama afirmou que antecipar o debate significaria tirar o protagonismo do ex-presidente num momento em que a família tenta demonstrar unidade.
Centrão acuado
Entre os governadores cotados para assumir eventual espólio — Tarcísio de Freitas, Ronaldo Caiado, Ratinho Júnior e Romeu Zema — o clima é de cautela.
Todos têm defendido publicamente Bolsonaro e evitado qualquer declaração que possa ser interpretada como avanço sobre a liderança do ex-presidente. Segundo um interlocutor do Palácio dos Bandeirantes, o momento é de “não irritar a família”.
Nos bastidores, dirigentes de PP, Republicanos e União Brasil avaliam que o congelamento do debate é resultado direto de uma disputa por protagonismo que tende a se intensificar nos próximos meses. A leitura é que a família busca evitar que o bolsonarismo se transforme em um movimento mais amplo e descentralizado, reduzindo seu poder de decisão.
Para o centrão, porém, um ponto é pacífico: nenhuma reorganização da direita ocorrerá sem Bolsonaro — mesmo preso. O presidente do Progressistas, Ciro Nogueira, sintetizou essa posição ao estabelecer uma condição explícita:
— O primeiro critério do nosso apoio em 2026 é se comprometer a conceder perdão a Bolsonaro.
Flávio candidato?
Com a família isolando o debate, setores do PL passaram a especular sobre um possível “plano B” que mantivesse o comando político dentro do clã. O nome de Flávio Bolsonaro voltou a circular, mas o senador descartou publicamente essa possibilidade:
— O meu nome não está na mesa. Eu pretendo ser candidato ao Senado no Rio de Janeiro. Nunca escondi isso de ninguém e não vou fazer um movimento para que isso aconteça — disse, na última segunda-feira.
Luísa Marzullo/O Globo — Brasília
