Cheguei hoje cedo a Campo Grande para um café com o senador Nelsinho Trad e fui recebido com uma cena que explica melhor do que qualquer discurso o estilo multifuncional da família Trad: o senador estava de jaleco, em pleno consultório de urologia, no centro da Capital. A mesa, um caos organizado, exibia receitas, exames de raio-X, anotações clínicas e, numa pasta separada, uma espécie de raio-X político: os valores das emendas que destinou a Dourados (veja o relatório ao final do texto).
— “Só ontem foram cinco milhões” — disse, enquanto afastava um prontuário para abrir espaço à documentação.
A boa relação com o prefeito Marçal Filho ajuda, segundo ele: “Quando eu era prefeito, ele era deputado. Agora os papéis se inverteram: ele é prefeito, eu senador. Isso facilita o entendimento, porque um sabe exatamente onde aperta o sapato do outro.”
Ao falar do acúmulo de funções — médico e senador — recorreu ao ensinamento paterno, que resume sua filosofia de trabalho melhor do que qualquer slogan de campanha: “Meu pai sempre ensinava: seja um profissional liberal político… e não um político profissional.”
Talvez seja por isso que Nelsinho continua clinicando sempre que a agenda permite — em especial às segundas e sextas-feiras — mantendo uma rotina que combina, no mesmo dia, prontuários e receitas de plenário, consultas e articulações.
E já que eu estava diante de um urologista devidamente uniformizado e, como sou hipocondríaco assumido, aproveitei a ocasião. Entre uma explicação sobre emendas e outra sobre convênios, pedi uma luz sobre meu pós-operatório de próstata. Nelsinho alternou a voz de senador com a de médico, me passou orientações rápidas e ainda me despachou com um pacote de amostras grátis, o que transforma qualquer conversa política numa visita produtiva.
O convite para o café foi feito no último sábado, quando o senador esteve em Dourados acompanhando o governador Eduardo Riedel na inauguração do asfalto de Picadinha. Garantiu que volta no dia 20, aniversário da cidade, para a inauguração do novo Hospital Regional — obra que tem parte substantiva de sua destinação parlamentar.
Saí da clínica lembrando dos meus tempos de setorista no Congresso Nacional, durante a Constituinte, quando aprendi que Brasília e um consultórios têm muito em comum: ambos lidam com crises repentinas, inflamações antigas, dores que ninguém assume e tratamentos cuja eficácia nem sempre é garantida.
A diferença é o olhar. No consultório, o médico encara o paciente antes de decidir o que fazer. Em Brasília, o senador-médico vira viajante permanente, cruzando ministérios e gabinetes para assegurar recursos às suas bases.
E foi justamente isso que me ocorreu ao deixar o consultório: entre jaleco, planilhas e amostras grátis, Nelsinho Trad ainda mantém o olhar firme voltado para Dourados — não como diagnóstico, mas como compromisso.

