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sexta-feira, agosto 22, 2025

Série de TV ‘O século do GLOBO’ conta trajetória do jornal e revisita momentos marcantes do país

Projeto combina entrevistas e recursos de dramaturgia: 'É uma história que nos dá oportunidade de refletir sobre o país', diz criador Pedro Bial

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Como diria Nelson Rodrigues, um dos mais icônicos colunistas que passaram pelas páginas do jornal O Globo, “100 anos não são 100 dias”. O centenário do jornal é a chance de revisitar muitas histórias — e também a própria história do Rio e do Brasil. Com estreia marcada para terça-feira (8), na TV Globo e no Globoplay, o projeto “O século do GLOBO” narra a trajetória do periódico, resgatando bastidores curiosos e momentos fundamentais da imprensa brasileira por meio de depoimentos e recursos de dramaturgia.

— A história de 100 anos do GLOBO é a história dos 100 anos de história do Brasil — diz Pedro Bial, criador do projeto. — É uma história que nos dá oportunidade de refletir sobre o país, sobre a nossa profissão, o nosso ofício, sobre a empresa em que a gente trabalha e sobre o que nos motiva e nos move adiante.

Pedro Bial e Roberto Irineu Marinho — Foto: Divulgação/ Joao Cotta
Pedro Bial e Roberto Irineu Marinho — Foto: Divulgação/ Joao Cotta

A ideia da série, que é dividida em quatro episódios de 45 minutos e reúne quase 50 entrevistas inéditas, nasceu na redação do próprio GLOBO e foi produzida pelos Estúdios Globo. Todos os depoimentos foram gravados em reconstituições detalhadas das redações do GLOBO em diferentes períodos — as décadas de 1920, 1950 e 1980. O resultado, que combina cenografia material com tecnologia de inteligência artificial e realidade aumentada, impressiona pela verossimilhança.

— Esse processo de imersão foi fundamental para ativar as memórias e emoções que surgiram nos depoimentos de profissionais que dedicaram 20 ou 30 anos ao jornal — diz Gian Carlo Bellotti, diretor artístico da série.

Além dos filhos de Roberto Marinho (João Roberto Marinho, José Roberto Marinho e Roberto Irineu Marinho), a série ouviu nomes como Leonêncio Nossa, Ali Kamel, Alan Gripp, Frederic Kachar, Maria Alice Rezende de Carvalho, Ernesto Rodrigues, Pedro Doria, Fernando Gabeira, Flávia Oliveira, Vera Araújo e o funcionário mais antigo do jornal, Marcelo Monteiro.

Volta no tempo e emoção

Bial lembra que alguns dos entrevistados que conheceram os ambientes originais tiveram crises de choro ao voltarem no tempo.

— É muito bom, dá muito sentido ao progresso, quando a gente pode usar a tecnologia para fins não apenas de exibicionismo, de “olha o que a gente pode fazer”, mas no ponto de vista humano, de “onde a gente pode chegar”, usando os recursos da técnica e da tecnologia — diz o jornalista.

João Roberto Marinho em cena de "O século do GLOBO" — Foto: Divulgação/ Joao Cotta
João Roberto Marinho em cena de “O século do GLOBO” — Foto: Divulgação/ Joao Cotta

As cenas ficcionais contam com um elenco que inclui Tony Ramos e Eduardo Sterblitch como Roberto Marinho em diferentes fases da vida. Ravel Andrade e João Vitor Silva interpretam seus dois irmãos, Rogério e Ricardo Marinho, respectivamente. Também participam da produção Bruno Mazzeo (como Nelson Rodrigues) e Marcelo Airoldi (como o ex-diretor de redação Evandro Carlos de Andrade), além de Rodrigo Simas, Miguel Rômulo, Marcos de Andrade e Livia Silva.

— A gente tem a clássica linguagem do documentário, uma pesquisa de imagens de acervo primorosa, uma pesquisa profunda em que a gente encontrou alguns tesouros da cinemateca — diz Bial. — Os episódios mais distanciados no tempo se valem de recursos ficcionais. E as cenas em que usamos recursos de ficção para reproduzir episódios em que não havia material de arquivo ganharam um tom de verdade, de realismo, muito grande. E acho que, sem querer estragar a surpresa, há revelações de acontecimentos, de fatos, em episódios que não foram registrados, porque eram de bastidores mesmo, mas que mostram a presença do GLOBO na história cultural do Brasil, de uma maneira surpreendente.

Ousadia e humildade

Fundado em 29 de julho de 1925, o jornal surge do desejo de Irineu Marinho por uma imprensa moderna e independente — uma visão que seria levada adiante por seu filho, Roberto, após a morte precoce do pai. Mais de 20 periódicos circulavam no Rio em 1929, mas o projeto se destacava pela ousadia gráfica e editorial. E, claro, na busca pelo furo, que se mantém no DNA do grupo através das décadas.

— Esse jornal, que começa como um pequeno jornal vespertino na capital da República, vai se mantendo, crescendo, e se transforma no maior império de comunicação da história do Brasil — diz Bial. — É uma história, sim, de ousadia, mas uma ousadia permeada de esperança. É uma ambição permeada de humildade diante da realidade. Então, acho que, se fosse resumir o recado, a inspiração que pode advir de assistir a essa série é que nós, brasileiros, podemos muito mais do que nós supomos. A gente é muito mais poderoso e criativo do que se pode imaginar.

As escolas de samba em 100 anos de cobertura do GLOBO

Desfile do Salgueiro em 1963, na Avenida Presidente Vargas — Foto: Acervo
Desde o primeiro desfile oficial o jornal sempre foi parceiro da grande festa popular

A série reencena um episódio de 1930 que virou símbolo da busca do jornal pela notícia em primeira mão. Então um jovem repórter de 25 anos, Roberto Marinho usou galhos de árvores para bloquear a passagem do carro que transportava o presidente Washington Luís, que acabava de ser deposto. Foi o tempo suficiente para que seu fotógrafo conseguisse o clique exclusivo — e histórico — do chefe de Estado, o primeiro após sua saída da prisão no Forte de Copacabana.

O episódio representa a vocação do GLOBO para a imagem, acredita Bial.

— É a primeira vez que um jornal registra em flagrante um evento dramático como a deposição de um presidente — lembra o jornalista. — Com um golpe militar, desencadeia-se uma história que vai narrar essa vocação da imagem do GLOBO.

‘Realizador de sonhos’

Após suas ousadias como repórter, Roberto Marinho assumiria a direção do jornal em 1931 e se manteria como figura central da imprensa brasileira até sua morte, em 2003. Quem encarna o jornalista e empresário em sua juventude é o ator Eduardo Sterblitch, até uma semana atrás no ar na novela “Garota do momento” no papel de Alfredo Honório, apresentador de TV e dono de uma emissora nos anos 1950.

— Sempre o enxerguei como uma espécie de Walt Disney brasileiro, um realizador de sonhos, alguém que fazia o impossível acontecer — diz o ator.

Tony Ramos dá vida a Roberto Marinho em série sobre o centenário do GLOBO — Foto: Divulgação
Tony Ramos dá vida a Roberto Marinho em série sobre o centenário do GLOBO — Foto: Divulgação

Tony Ramos, que aparece como Marinho em uma idade mais avançada, já havia interpretado o jornalista em uma cena de “Garota do momento”. Mesmo sem ter tido uma convivência cotidiana com Roberto Marinho, ele se lembra de vê-lo na sede da TV Globo no Jardim Botânico, no início de sua trajetória como ator.

— O que me chamava atenção era a forma como ele chegava: cumprimentava a todos, com naturalidade, chamando muitos pelo nome — conta Tony. — Nunca evitava o contato, pelo contrário, havia ali uma presença muito humana, muito respeitosa. Ele tinha gestos muito econômicos. Nada nele era aleatório. Era um homem sereno, muito bem posicionado. Essas lembranças me ajudaram bastante na construção do personagem.

A história de “O século do GLOBO” é guiada em três eras específicas. O período entre 1925 e 1954, na primeira redação do GLOBO; os anos 1960 e 1970, o jornal numa sede maior; e, por fim, de 1980 a nossos dias, marcados pela modernização.

Mario Filho e o futebol

Desde a sua fundação, o GLOBO atravessou e cobriu revoluções políticas, culturais e tecnológicas. Começou como um jornal vespertino, vendido à noite, e se adaptou décadas depois à era da internet e das redes sociais. O documentário acompanha uma jornada que vai da política do café com leite aos recentes escândalos da operação Lava Jato, passando pelo Estado Novo, pela ditadura militar e pela redemocratização. Mostra como o jornal ajudou a popularizar o futebol graças à visão mercadológica de Mario Filho e aos textos apaixonados de Nelson Rodrigues, relembra a proteção de Roberto Marinho a funcionários durante a repressão da ditadura militar, e acompanha a transição do jornalismo impresso para o digital.

Momentos de turbulência na redação também são retratados. O segundo episódio relembra o baque do suicídio de Getúlio Vargas, que levou a população a atacar a sede e os carros de reportagem do GLOBO, que fazia oposição ao finado presidente em 1950. A reconstituição dramática e as cenas com as poucas imagens históricas de arquivo dos motins dão uma ideia da tensão que envolveu o jornal e seus funcionários. Foi um dos momentos mais dramáticos vividos da vida jornalística e empresarial de Roberto Marinho.

No mesmo episódio, vemos a relação conflituosa do jornalista com a ditadura militar. Mesmo apoiando o regime, o GLOBO é afetado pela repressão e pela censura, para desgosto de seu dono. No mesmo período, Roberto Marinho se volta para o seu ambicioso projeto de emissora de TV, que terá repercussões para o jornal.

— O documentário mostra como antigamente as relações de um jornal como o GLOBO estavam associadas ao seu dono, ao seu líder, Roberto Marinho, com o poder — explica Bial. — Roberto Marinho e o GLOBO são uma coisa só. Acho difícil isso ser transportado para a história de outros jornais.

Para Bial, era a oportunidade de contar a história do GLOBO através de um homem que “corporificava” e “humanizava” o jornal.

— Roberto Marinho era um homem de grande ambição, um visionário, com uma coragem física e empresarial desmedida, que construiu algo que ninguém nem supunha ser possível na história do Brasil — diz Bial. — Acho que a ousadia de arriscar, de querer mais, de não se satisfazer com pouco, é o exemplo que pautou toda a nossa criação. Eu acho que é isso que nos movimenta e nos inspira até hoje, na Globo.

Um centenário em quatro atos

Episódio 1 — A origem. Em 1925, Irineu Marinho lança o jornal vespertino O GLOBO, mas morre apenas 23 dias depois. O filho mais velho, Roberto Marinho, assume o comando em 1931 e dá seguimento ao ideal de um veículo moderno e ousado. Sob sua liderança, o jornal atrai grandes nomes da imprensa e da cultura, como Mario Filho e Nelson Rodrigues, firmando sua vocação para o protagonismo editorial.

Episódio 2 — O jornal e a ditadura. Como outros veículos que fizeram oposição a Getúlio Vargas, o jornal é atacado por apoiadores do presidente após o seu suicídio. Vêm o golpe de 1964 e o alinhamento com os militares, mas Roberto Marinho protege, nos bastidores, jornalistas com posições à esquerda. Com sua atenção voltada à ascensão da TV Globo, ele entrega a direção do jornal a Evandro Carlos de Andrade, que ajuda a elevar a qualidade da redação e a ampliar sua independência editorial.

Episódio 3 — A volta da democracia. A abertura política dá novo fôlego ao GLOBO, que se consolida como o principal jornal do Rio. A cobertura de eventos marcantes como o naufrágio do Bateau Mouche, os escândalos que levaram ao impeachment de Collor e a chacina de Vigário Geral reforçam sua relevância jornalística. Em 1995, Roberto Marinho convida Evandro Carlos de Andrade para chefiar o jornalismo da TV Globo.

Episódio 4 — Presente e futuro . Após a morte de Roberto Marinho, em 2003, seus filhos assumem a liderança do Grupo Globo e conduzem a transição para o jornalismo do século XXI. Em meio à ascensão das redes sociais, da polarização política e da crise do modelo impresso, o GLOBO aposta na digitalização e se consolida como o maior jornal do país.

Bolívar Torres/O Globo

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