A Justiça Eleitoral determinou a suspensão dos perfis do candidato Pablo Marçal (PRTB) em redes sociais até o final das eleições. A decisão, em caráter liminar, foi concedida em ação movida pelo PSB, partido da também candidata Tabata Amaral, e atinge os perfis do influenciador nas redes Discord, Facebook, Instagram, Meta, TikTok e X (ex-Twitter).
Marçal reagiu à decisão, desafiou a Justiça ao pedir pressão contra o que chama de sistema, criou novas contas nas redes sociais, cobrou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a agir e falou em “perseguição” na disputa à prefeitura paulistana.
Marçal pode agora recorrer contra a decisão ao TRE-SP (Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo). Caso isso ocorra, o juiz do TRE-SP que receber o recurso poderá decidir individualmente ou levar o caso para o colegiado da corte de segunda instância, formado por sete magistrados.
O juiz eleitoral Antonio Maria Patiño Zorz acolheu o argumento de que Marçal está cometendo abuso econômico ao promover cortes monetizados. Os cortes são trechos de entrevistas, sabatinas, participações em debates e outros vídeos que depois são postados em redes sociais. Eles são a chave da popularidade digital de Marçal. O influenciador promove competições de cortes de vídeos com direito a remuneração aos seguidores.
Segundo o juiz, monetizar cortes “equivale a disseminar continuamente uma imagem sem respeito ao equilíbrio que se preza na disputa eleitoral. Notadamente o poderio econômico aqui estabelecido pelo requerido Pablo suporta e reitera um contínuo dano e o faz, aparentemente, em total confronto com a regra que deve cercar um certame justo e proporcional”.
O magistrado afirma que Marçal está promovendo uma espécie de disputa entre seus seguidores e a suspensão dos perfis é necessária para “coibir flagrante desequilíbrio na disputa eleitoral e estancar dano decorrente da perpetuação do ‘campeonato’”.
“Atente-se que a postura do requerido Pablo fideliza e desafia seguidores, que o seguem numa desenfreada busca de ‘likes’ em troca de vantagens econômicas. Diz o requerido que ‘ensina a ganhar’ dinheiro ao usuário, mas a sua imagem e ‘cortes’ chegam a um sem número de pessoas, num espantoso movimento multiplicador e sem fim”, escreveu o juiz.
“Conste que há documento demonstrando que um dos pagamentos proveio de uma das empresas pertencentes ao requerido Pablo, o que pode configurar uma série de infrações.” O magistrado ressaltou que a suspensão mira apenas contas que promoverem a monetização de cortes de vídeo.
“Por fim, destaco que não se está, nesta decisão, a se tolher a criação de perfis para propaganda eleitoral do candidato requerido, mas apenas suspender aqueles que buscaram a monetização dos ‘cortes’ por meio de terceiros interessados”, escreveu o magistrado.
Filipe Sabará, da coordenação de campanha de Marçal, reagiu: “Absurda essa decisão liminar como antecipação de sanção. Quando o sistema começa a agir assim é porque sabe que vai perder com chances de ser no primeiro turno”.
O senador Sergio Moro, ex-juiz e ex-ministro de Bolsonaro, também criticou a decisão. “Suspender as redes sociais de um candidato —de qualquer candidato— liminarmente e sem direito de defesa é uma agressão à liberdade de expressão e política. Se existe impulsionamento ilegal, que se comprove e corrija-se isso e não se suspenda tudo. A Justiça precisa ter proporção”, afirmou em suas redes sociais.
Em nota, a campanha de Tabata comemorou a decisão. “O que a Justiça Eleitoral está apontando é que há suspeitas concretas de que o Marçal fez uso de recursos ilegais para se promover nessas eleições. É uma decisão liminar. Basicamente, Pablo caiu no antidoping.”
Ricardo Nunes disse ser “contra qualquer tipo de censura”, mas que a regra tem de ser igual para todos. “Ou a Justiça libera todos os candidatos para fazerem o mesmo, ou ninguém utiliza estrutura paralela com cortes impulsionados”, afirmou o prefeito.
O Ministério Público Eleitoral já havia pedido anteriormente a abertura de uma ação de investigação judicial eleitoral contra Marçal, citando abuso de poder econômico relacionado à propagação desses cortes.
A acusação dos promotores é que os vídeos de Marçal estariam sendo cortados e propagados por terceiros mediante ganhos financeiros, o que é vedado pelas regras eleitorais. Em nota, Marçal disse que “não há financiamento nenhum por trás disso”.
A atuação do candidato tem imposto um desafio à Justiça Eleitoral e a suas ferramentas no sentido de impedir desequilíbrios na disputa.
O caso de maior relevo até o momento envolveu falas do influenciador insinuando, sem nenhum lastro em fatos, que Guilherme Boulos (PSOL) seria um usuário de drogas. Por esse motivo, Marçal acumula, na primeira instância, decisões de remoção de conteúdo de suas contas e de direito de resposta ao deputado federal.
Mesmo assim, e apesar de ter havido determinação de abertura de investigação policial sobre os fatos, tem repetido o factoide em eventos e nas redes sociais.
A postura agressiva de Marçal, com ofensas pessoais e provocações depois exploradas em suas redes sociais, já levou rivais a desistirem de um debate e impulsionou uma cobrança do prefeito Ricardo Nunes (MDB) por maior agilidade da Justiça Eleitoral, classificada por ele como “lenta”.
Um dia depois dos desfalques do prefeito, de Boulos e de José Luiz Datena (PSDB) no evento organizado pela revista Veja, Nunes chegou a sugerir inclusive que representantes da Justiça Eleitoral estivessem presentes em debates eleitorais.
Além do teor de suas falas e postagens, a conduta de Marçal nas redes sociais também virou alvo de questionamentos pela forma.
Flávio Ferreira e Isabella Menon/Folha de S. Paulo