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terça-feira, novembro 26, 2024

Flávio Dino, o ministro dos Três Poderes

Em 2024, Flávio Dino de Castro e Costa, 55 anos, conseguiu uma façanha. Foi ministro da Justiça e Segurança Pública, um dos cargos de maior destaque do Executivo

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Em 2024, Flávio Dino de Castro e Costa, 55 anos, conseguiu uma façanha. Foi ministro da Justiça e Segurança Pública, um dos cargos de maior destaque do Executivo; senador da República, mandato mais cobiçado no Legislativo; e na próxima semana veste a toga na mais importante corte do país, o Supremo Tribunal Federal (STF). É como um jogador de futebol que entra em campo para fazer gols, prepara a tática da equipe e apita o jogo.

No discurso em que transmitiu o cargo para seu sucessor no Ministério da Justiça, Ricardo Lewandowski, Dino afirmou: “Permitam-me saudar a todos na figura do meu presidente no Executivo, Luiz Inácio Lula da Silva, meu presidente no Legislativo, senador Rodrigo Pacheco, e meu presidente no Judiciário, Luís Roberto Barroso, um ontem, um hoje e um logo ali na esquina, logo amanhã”.

Flávio Dino por ora vai desembarcar no Judiciário. Não significa, no entanto, que não se reinvente e — quem sabe — um dia volte ao Executivo. Muitos apostam que ele possa no futuro concorrer à Presidência da República. Completa 56 anos em abril e tem 19 anos pela frente na magistratura até a aposentadoria compulsória no STF. E mudar de rumo nunca foi um problema para esse maranhense, de São Luís.

Aos 25 anos, Dino foi o primeiro colocado no concurso para juiz federal. Tomou posse no ano seguinte e permaneceu na magistratura por 12 anos. Na carreira, enfronhou-se na política corporativa como presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), entre 2000 e 2002. Depois assumiu a função de diretor de Assuntos Legislativos da entidade. Assim, ganhou projeção para concorrer a um mandato de deputado federal.

Para disputar a eleição, Flávio Dino precisou pedir exoneração do cargo de juiz. Ele se elegeu pelo PCdoB e exerceu o mandato de 2007 a 2011. Na Câmara, conseguiu a aprovação de três leis relacionadas à Justiça e exerceu o mandato parlamentar afinado com ministros do STF, como Gilmar Mendes, na elaboração de projetos de lei.

É de Flávio Dino a lei que disciplinou as regras das ações diretas de inconstitucionalidade por omissão (ADOs), processo que tem por objetivo efetivar direitos constitucionais nos casos em que há omissão do Poder Público. Também são dele duas outras leis. Uma delas regula o procedimento de mandado de injunção. A outra permite que relatores de ações penais originárias no STF e no Superior Tribunal de Justiça (STJ) convoquem juízes de primeira e segunda instâncias para instruir os processos.

A política está no sangue. O pai, Sálvio Dino, foi vereador de São Luís, deputado estadual e, em 1964, teve os direitos políticos cassados. Nas eleições de 1988, foi eleito prefeito de João Lisboa, pelo PFL. Em 1996, conseguiu um segundo mandato no município. Foi advogado e jornalista e atuou como revisor e repórter dos Diários Associados e em júris populares no Maranhão. Na juventude, foi líder estudantil. Assim também começou Flávio Dino, como presidente do Grêmio Estudantil Coelho Neto do Colégio Marista, em São Luís.

No Executivo, ele estreou como presidente da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur). Foi uma preparação para a vitória no governo de seu estado, em 2014, no primeiro turno, contra o grupo liderado pelo ex-presidente José Sarney, que dominava a política no Maranhão por décadas. Quatro anos depois, Dino se reelegeu, também no primeiro turno, à frente de Roseana Sarney (MDB).

O embate de Flávio Dino com o clã Sarney permeou, durante anos, a trajetória do político no Maranhão. Mas o tempo o aproximou do ex-presidente. Em 2021, os antigos rivais estiveram juntos no apartamento de Sarney, em São Luís. O assunto: um possível apoio do ex-presidente, membro da Academia Brasileira de Letras, à candidatura de Dino na Academia Maranhense de Letras. Em jogo, a vaga que havia sido ocupada por Sálvio Dino, até a morte dele, aos 88 anos, no auge da pandemia, vítima da covid-19.

Nenhum apoio de Sarney foi declarado publicamente. Mas Flávio Dino teve 25 dos 35 votos para se tornar um imortal no Maranhão. O diálogo com Sarney ocorreu também na campanha de 2022. Numa aliança informal com o clã, Flávio Dino manteve a sequência de grandes vitórias e se elegeu senador com mais de 62% dos votos, cargo que agora abdica para retornar à magistratura.

Flávio Dino não é de fugir de um confronto. Foi um dos maiores opositores do ex-presidente Jair Bolsonaro e fez duras críticas ao governo anterior. Dino se manifestou como ministro da Justiça e chefe da Polícia Federal em caso que será analisado pelo STF envolvendo Bolsonaro. Esse é um dos motivos que provocam dúvidas sobre a possibilidade de se considerar suspeito para julgar processos envolvendo Bolsonaro. Mas a aposta de advogados é de que qualquer decisão sobre participar ou não das discussões será respeitada pela maioria dos ministros do STF.

Dino não demonstra receio de se expor. Sobressaiu-se em momentos de grande impopularidade de Dilma Rousseff e de Lula. Foi um aliado leal da ex-presidente durante o processo de impeachment e é apontado como um dos autores da tese de que a petista sofreu, na verdade, um golpe para ser destituída da Presidência.

Ele chegou a organizar uma comitiva de governadores para uma visita a Lula na prisão e fez críticas públicas à atuação de Sergio Moro, então juiz da Lava-Jato.

Lula reserva aos amigos solidários nos tempos de prisão um reconhecimento especial. Assim foi com Flávio Dino, que se tornou um dos principais integrantes do atual governo.

Na pandemia, Dino perdeu o pai, mas salvou muitas vidas. Na sua gestão como governador, o Maranhão foi o estado com a menor taxa de mortalidade por covid-19 do país, apesar de ser a unidade da Federação em que as estatísticas apontam situação de extrema pobreza. A gestão da pandemia pelo ex-presidente Bolsonaro é um dos temas que devem passar por Dino como ministro do STF.

A morte do pai por covid não foi o único drama pessoal de Flávio Dino. Em 2012, perdeu o filho Marcelo Dino, conhecido como Peixinho, numa crise de asma. O garoto tinha apenas 13 anos e faleceu em hospital particular de Brasília. Dino nunca aceitou o drama e responsabilizou o hospital pelo que considerou descaso e erro médico. Houve longos debates na Justiça sobre o tema. Ele chegou a ganhar o direito a uma indenização porque a Justiça reconheceu que houve demora na aplicação de uma medicação.

Católico praticante, botafoguense, Dino está no segundo casamento, com Daniela Lima. No Ministério Público, tem o irmão Nicolao Dino, subprocurador-geral da República, que esteve em 2017 no topo da lista eleita pela classe para a Procuradoria-Geral. Mas não foi nomeado pelo então presidente Michel Temer.

Recentemente, o próprio Flávio Dino defendeu o direito de o presidente Lula escolher o PGR sem se submeter ao crivo da classe. A influência do então ministro da Justiça acabou por inviabilizar ou adiar planos de Nicolao Dino. Seria considerado um caso clássico de favorecimento, embora os dois tenham brilhos próprios.

Na semana passada, na condição de senador, Flávio Dino apresentou projetos de lei. Um deles cria regras rígidas para a decretação de prisões preventivas. Em balanço de sua atuação no Ministério da Justiça, criticou exageros nas prisões. Um sinal de como vai agir no STF.

Ana Maria Campos/Correio Braziliense

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