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quinta-feira, abril 18, 2024

Lula ‘Robin Hood’ e Bolsonaro, o ‘alívio da verdade’: os achados das pesquisas qualitativas a dois meses das eleições

Frases de lulistas e bolsonaristas colhidas em grupos focais revelam com mais profundidade sentimentos de eleitores dos dois pré-candidatos que lideram a corrida para a Presidência

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As pesquisas qualitativas são feitas Brasil afora para medir, no detalhe, sentimentos de eleitores diante de uma infinidade de situações e perguntas, como o Pulso já explicou em reportagem. Independentemente dos clientes que contratam empresas de pesquisa e seus interesses, as “qualis” revelam pensamentos de indivíduos que ajudam tanto um candidato a moldar melhor o discurso de acordo com sua estratégia quanto um governo ou marca de bebida a se comunicar melhor com cidadãos e clientes.

A dois meses das eleições, essa modalidade de pesquisa de opinião pública, claro, tem abordado muito as impressões sobre os dois pré-candidatos mais bem colocados nos levantamentos: Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL). Sócio do Instituto Travessia, o antropólogo e cientista político Renato Dorgan separou para o Pulso frases representativas de eleitores de diferentes regiões do Brasil que mostram pensamentos, conceitos e preconceitos — por vezes surpreendentes — sobre os dois pré-candidatos, praticamente impossíveis de serem detectadas nas pesquisas quantitativas, aquelas que mostram os números de intenção de voto e que serão cada vez mais constantes daqui a até o fim do primeiro turno.

As pesquisas “quali”, vale lembrar, buscam leituras específicas e em mais profundidade de eleitores sobre o cenário atual e não têm a capacidade de generalizar seus resultados para a população como um todo. São diferentes das quantitativas, que trabalham com amostras de entrevistados feitas para refletir o universo de eleitores do país.

Bolsonaro e suas ‘verdades’

Nos grupos focais, eleitores de Bolsonaro demonstram identificação com o temperamento do presidente e, muitas vezes, não citam uma opinião, programa de governo ou discurso específico do pré-candidato à reeleição:

O Bolsonaro é aquele cara que diz a verdade como eu. Perde muita coisa por isso, briga com família, amigos e até filhos, mas se sente aliviado em falar a verdade, o que pensa” Homem, 48 anos, taxista de Mato Grosso do Sul, classe B2 (renda familiar média mensal de R$ 5,7 mil).

Para outros entrevistados, a linguagem corporal fala mais alto. Vestir camisas de diversos clubes de futebol ao longo de quatro anos pode trazer conotações altamente positivas:

Bolsonaro usa camisa de futebol. Qual é o político que faz isso, tudo engravatado, com camisa bonita, cara? E não é só de time com muita torcida para agradar, é de qualquer time“. Homem, 29 anos, de Rondônia, classe C2 (renda familiar média mensal de R$ 1,9 mil).

O aspecto religioso de Bolsonaro e da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, também é observado como atributo valioso, mesmo que a eleitora abaixo o enxergue como “crente” e use uma palavra preconceituosa contra religiões de matrizes africanas. Bolsonaro tem alto trânsito e relações consolidadas com evangélicos, mas considera-se católico.

Ele diz as verdades, político normalmente é macumbeiro e finge ser católico. O Bolsonaro é crente, não tem vergonha de assumir, a mulher dele é de Deus, eu gosto disso“. Mulher, 53 anos, do Acre, classe C2 (renda familiar média mensal de R$ 1,9 mil).

Lula, a memória do governo e o despertar ‘do pesadelo’

Após as ações penais decorrentes do mensalão e da Lava-Jato, que levaram petistas e políticos do centrão (muitos hoje com Bolsonaro) para a cadeia, o ex-presidente Lula pode ser visto, aos olhares de um jovem em uma pesquisa “quali”, como um tipo de Robin Hood. Aos 21 anos, o entrevistado não acompanhou de perto as investigações e julgamentos, mas interpreta o porquê dos acontecimentos de forma clara e direta:

Lula é uma espécie de Robin Hood, tira dos ricos e dá para os pobres“. Jovem, 21 anos, de Mato Grosso do Sul. classe C1 (renda familiar média mensal de R$ 3,2 mil).

Já para quem passou por dificuldades para comprar comida, a memória dos governos Lula e de programas sociais como o Bolsa Família pesa muito. Comer carne conta, como explica essa entrevistada em grupo focal:

Eu voto em Lula para voltar a comer carne. E digo o porquê. É fácil quem comeu carne a vida toda achar que é um absurdo votar em Lula por isso. Mas sou do sertão, não comia quase carne até meus 20 anos. Quando Lula ganhou, passei dez anos comendo sem me preocupar com isso e hoje outra vez não como, não consigo comprar nem sobra e osso. Quero acordar desse pesadelo.” Mulher, 43 anos, da Paraíba. classe C2 (renda familiar média mensal de R$ 1,9 mil).

O antipetismo pode até se manifestar entre eleitores de Lula, mas considerações sobre o que seria o objetivo final do presidente, neste caso positivo, ficam evidentes na frase abaixo:

Lula se preocupa com os pobres, qual de nós nunca roubou e mentiu? O mais importante é que nós ajudamos quem precisa“. Mulher, sem idade especificada, de Pernambuco, classe D (renda familiar média mensal de R$ 860).

Já o antibolsonarismo aparece também relacionado a traumas pessoais vividos por entrevistados:

Bolsonaro é tudo de ruim, vejo nele meu vizinho que me abusou, meu pai e o pastor da minha igreja que não me aceitou, meus clientes que me trataram feito lixo” Transexual, 42 anos, de São Paulo, classe C1 (renda familiar média mensal de R$ 3,2 mil).

Renato Dorgan, do Travessia, ressalta a importância da identificação pessoal com o político, que não está relacionada somente a aspectos econômicos que envolvem o bolso de cada um. Sem esse processo pessoal, dificilmente uma opção de terceira via pode ser competitiva.

— A conquista eleitoral, com sinais simples, mostra que a identificação do eleitor com o político faz parte do sucesso eleitoral no Brasil. Bolsonaro e Lula criaram uma identidade popular baseada em estilos de vida, comportamentos e defesas ideológicas semelhantes aos das pessoas comuns. Talvez seja esse, hoje em dia, o principal ativo de cada um, e uma das explicações de a terceira via não se consolidar desde 2018, já que nitidamente existe uma distância dos políticos de centro com o cidadão comum — explica Renato Dorgan, especialista em pesquisas qualitativas e sócio do Instituto Travessia. (Flávio Tabak/O Globo — São Paulo).

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