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sexta-feira, novembro 22, 2024

Derrubando muros

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O sociólogo e investidor José Cesar Martins coordena o Derrubando Muros, grupo apartidário que decidiu se unir em meio aos riscos à democracia no governo do presidente Jair Bolsonaro e na busca por uma agenda capaz de impulsionar o Brasil. Formada por mais de 90 membros, a iniciativa reúne políticos de diversos partidos, empresários, cientistas, pesquisadores e economistas. São nomes como o do ex-candidato à Presidência Eduardo Jorge (PV), o ex-ministro Raul Jungmann, o empresário Fersen Lambranho, a economista Elena Landau e o epidemiologista Pedro Hallal. Nos últimos meses, o grupo tem mirado as eleições de 2022, já se reuniu com os presidenciáveis Sergio Moro (Podemos), Ciro Gomes (PDT) e João Doria (PSDB), e ouviu o governador do Maranhão, Flávio Dino (PSB), e a empresária Luiza Trajano.

Em entrevista ao jornal O Globo, Martins alerta para a importância de a oposição a Bolsonaro, que chama de “campo democrático”, construir um pacto de governabilidade a partir de projetos para o país e defende que alianças entre políticos de campos ideológicos distintos, a exemplo da negociação entre o ex-presidente Lula e o ex-governador Geraldo Alckmin, são um “bom sinal” de que os candidatos estão preocupados com eleitores para além de suas tribos.

O que é o Derrubando Muros?

É um grupo de pessoas com diferentes origens preocupado com as ameaças à democracia. Por coincidência, uma semana depois que fizemos a primeira reunião, eclodiu a pandemia. Tínhamos um governo ameaçador, sem apreço democrático, e sem nenhuma ideia de gestão, de política pública, e uma pandemia nos atacando. Deu no que deu. Temos o propósito de nos concentrar sobre questões como “onde a gente errou?” e “onde a democracia deixou de entregar?”. Desde o início, nosso objetivo é olhar para um projeto de país, um país que decide seu destino, que faz escolhas, e que para isso tem que ter uma agenda. No Brasil, a gente tem essa carência: a política em geral é feita sem projeto. Na disputa eleitoral, as coisas não só não são claras como são mascaradas com o objetivo de cativar e não gerar cobranças. A gente investe na clarificação de posições.

Que agenda o grupo defende?

Nós temos algumas premissas que nos juntaram e uma delas é que achamos que o Brasil precisa se integrar internacionalmente com estratégia geopolítica, de maneira propositiva, e que tem que estar preparado para usufruir desse benefício. Qual o político que vai fazer essa tradução para uma estratégia eleitoral? A gente não sabe. Nós hoje estamos vendo Doria, Moro, Lula e outros candidatos, e a gente está menos preocupado com quem vai ganhar e mais com o que estão propondo para o Brasil. Como nos grandes gargalos, que não são poucos, e nas grandes oportunidades brasileiras esse candidato se coloca à altura do momento que vivemos? Temos a desigualdade que é um problema enorme. A economia verde, por outro lado, é uma oportunidade maior ainda, num país em que 61% do seu território é Amazônia.

A posição da nossa iniciativa é agnóstica de candidato. Nossa restrição é a boçalidade antidemocrática do atual presidente. Não consideramos qualquer coisa que vem desse governo. Pensamos o Brasil a partir de 2023. Até lá temos que fazer a melhor escolha à luz de uma ambição de país.

Os pré-candidatos estão dispostos a buscar diálogo e “derrubar muros”?

A construção de diálogos exige disciplina própria. O Brasil está no chão. Para a gente caminhar, não importa quem vença, desde que entre as alternativas democráticas, haja um pacto por objetivos essenciais. Não basta ter uma agenda. A agenda só é executada se houver um memorando de entendimento, de forças que se dispõem a assinar um pacto de governabilidade. Tenho ouvido pessoas de dentro do PT e de centro-direita falando em pacto de governabilidade. Não temos parlamentarismo, mas não há nada que vede criar um acordo de governabilidade. É o nosso desafio. Até porque, sem acordo, quem ganhar vai apenas iniciar um terceiro turno, não governar.

Como fazer isso num modelo em que o centrão é essencial para a governabilidade?

Se vencer um candidato de esquerda, é melhor para o país uma composição de apoio no centro democrático do que com um centro fisiológico. É melhor que ele governe fazendo as concessões necessárias. Se ganhar centro ou centro-direita, é melhor um acordo programático à esquerda do que vender a alma para o centrão.

Esse acordo pode acontecer?

Vemos diariamente sinais. Temos conversado com todos. Há um esforço de muitos atores em não contaminar o projeto que precisamos para o país com a disputa eleitoral. Elas vão se encontrar ali na frente, se desse conjunto vencer alguém civilizado. Ninguém quer um terceiro turno, ninguém quer ficar com a batata quente de não saber como governar o país, lidar com orçamento secreto, um alto número de partidos. Essas fórmulas precisam ser enterradas nas eleições de 2022.

É preciso enxugar o número de candidaturas para esse acordo?

Não acho que seja preciso. Vai contra a natureza dos políticos. Eles precisam descobrir por si mesmos que não vai ter espaço para todos.

Mesmo que Bolsonaro não vença, o bolsonarismo continua. Como incluir esse eleitorado?

A democracia tem que entregar. Nós temos que provar que a democracia não é um regime frouxo. Democracia e populismo são antagônicos. O que esperamos é que as causas das frustrações sejam eliminadas. As demandas estão lá e a democracia perdeu capacidade de resposta. Por isso, temos que investir na agenda e no pacto de governabilidade.

Como vê aproximação entre Lula e Alckmin?

É um excelente sinal que a esquerda mande sinais mais ao centro e a direita também. É uma evidência de que mesmo quando os candidatos falam para suas tribos estão preocupados com quem não está nela. Não sabemos se vai ser o Alckmin, mas evidentemente o vice do Lula não vai ser alguém da esquerda. É um sinal de que o Lula sabe que um eventual governo dele precisa transitar com setores menos comprometidos com a tradição da esquerda. Acredito que os demais candidatos vão fazer caminhos similares.

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