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quinta-feira, abril 25, 2024

Janismo preserva marcas na política do Brasil 30 anos após morte de Jânio Quadros

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Uma relação externa que contempla ligações com países em desenvolvimento e a ideia de um herói de fora da política que irá moralizar a administração pública são duas das marcas da carreira de Jânio Quadros que, 30 anos após sua morte, ainda podem ser observadas na administração pública brasileira.

A avaliação é de especialistas em história política do Brasil.

Esse movimento na relação externa foi posteriormente replicado por outros presidentes, com mais ênfase nos governos de Lula (PT).

O discurso de moralização do candidato fora da política pode ser observado em falas de administradores de diferentes linhas ideológicas, como Fernando Collor (Pros), João Doria (PSDB) e Jair Bolsonaro (PL).

Considerado conservador, Jânio surpreendeu ao assumir a Presidência em 1961 e implementar uma política externa que englobava relações com países que não eram considerados potências econômicas mundiais.

Trinta anos após sua morte, completados nesta quarta-feira (16), especialistas consideram que este pode ser um de seus principais legados para a política brasileira.

Ele abriu frentes diplomáticas na África e na Ásia. Isso colocou o país, ao menos neste quesito, dentro do grupo dos não alinhados, aqueles países que tentavam manter relações externas autônomas das disputas da Guerra Fria entre EUA e União Soviética.

“É chamada de política externa independente, que o João Goulart levou adiante. Depois o Geisel levou adiante. Depois o Lula levou adiante. Esse foi um legado dele”, avalia Jorge Ferreira, professor de história do Brasil da UFF (Universidade Federal Fluminense).

Jânio iniciou o processo de implementação das relações comerciais com a União Soviética e com a China em um período no qual o Brasil não tinha interação com esses países devido ao anticomunismo.

“A eleição de Jânio Quadros confundiu o eleitorado de esquerda”, diz Jorge Ferreira. Segundo ele, Jânio, apesar de ser um candidato conservador, tinha uma postura progressista na política externa.

“Ele disse claramente que iria reatar relações com a União Soviética” diz. “Enquanto isso, o candidato Marechal Henrique Teixeira Lott, da coligação de centro-esquerda, embora um nacionalista, era anticomunista”, contextualiza.

“É aí que se forma a chapa Jânio-Jango. Setores do movimento sindical viram em Jânio um candidato que poderia levar avanços nos campos das esquerdas.”

O professor da UFF afirma que João Goulart era aprovado no movimento sindical —e, na época, as eleições para eleger presidente e vice tinham votações independentes.

Jânio teve uma carreira meteórica. Em apenas 13 anos ocupou os cargos de vereador, prefeito de São Paulo, deputado estadual, governador de São Paulo e presidente do Brasil.

Ele era uma figura muito popular, diz Felipe Loureiro, professor do Instituto de Relações Internacionais da USP. “Estamos falando talvez do maior fenômeno eleitoral do Brasil pós-guerra. Mesmo comparado ao Getúlio Vargas, que teve por muito tempo a máquina do Estado nas mãos”, diz o historiador.

Uma de suas principais características políticas foi uma ausência de identificação partidária, fator que ele mesmo deixava claro em sua trajetória.

Felipe Loureiro diz que ele tinha também “um viés autoritário”, “uma figura bastante centralizadora e que tinha dificuldade de dialogar com outros Poderes”. Jânio chegou também a romper com importantes líderes do seu próprio partido.

A troca constante de partidos, a dificuldade de se relacionar com outros Poderes e as brigas com membros da própria legenda são características observáveis ao longo da carreira do atual presidente Jair Bolsonaro.

Outra característica marcante de Jânio é que ele se colocava como alguém de fora da política e que seria um moralizador da gestão pública. Daí a utilização da vassoura, símbolo que ficou famoso em suas propagandas políticas.

O governador paulista, João Doria, pré-candidato ao Planalto, utilizou desse discurso em campanhas eleitorais. Outro pré-candidato à Presidência nas eleições deste ano que também já adotou falas do tipo é o ex-juiz Sergio Moro (Podemos).

O próprio presidente Bolsonaro buscou usar esse discurso em sua campanha em 2018, embora já fosse um deputado federal por cerca de 27 anos.

Afeito ao uso de mesóclises (colocação do pronome no meio do verbo), Jânio tinha sua forma de falar criticada, o que contribuiu para popularizar uma imagem caricatural dele.

Por coincidência, o Brasil teve, anos após a morte de Jânio, o presidente Michel Temer (MDB), que também era inclinado a utilizar mesóclises em seus discursos.

Embora fizesse discursos classificados como populistas, na área econômica Jânio manteve um programa com medidas impopulares, segundo Jorge Ferreira.

Na época, de acordo com o pesquisador, o país estava com as contas descontroladas e a inflação aumentando. Nesse momento ele fez um acordo com o FMI e aplicou cortes nos subsídios ao trigo e à gasolina. As medidas geraram insatisfação entre a classe média e os trabalhadores de menor renda.

Outra medida econômica tomada em seu governo foi o fim da diferenciação do câmbio.

“Ele fez uma política econômica que hoje seria elogiada por economistas ortodoxos”, afirma Jorge Ferreira. “As medidas ortodoxas e conservadoras exigidas pelo FMI foram implementadas no país.”

Sobre a renúncia de Jânio, poucos meses após assumir a Presidência, Felipe Loureiro considera que está consolidada a avaliação de que foi uma tentativa de golpe.

Imaginando que seu vice, João Goulart, teria dificuldades para ser aceito por militares e por outros setores da sociedade civil, Jânio, que enfrentava turbulências no relacionamento com o Congresso, analisou que após sua renúncia voltaria mais forte, convocado a reassumir o posto, e com mudanças constitucionais que lhe proporcionassem mais poder. Mas o cálculo deu errado.

“A renúncia foi um estopim importantíssimo para a instabilidade política que marcaria os anos entre 1961 e 1964 e que culminaria com o golpe de 64”, afirma Loureiro.​

Anos após deixar a Presidência, Jânio voltaria a ser prefeito da cidade de São Paulo, na década de 1980, no fim da ditadura militar.

Em 1992, Jânio morreu aos 75 anos de idade. Ele estava internado com grave crise respiratória. Meses antes, ele já vinha apresentando complicações de saúde. (Tayguara Ribeiro/Folha de S. Paulo).

TRAJETÓRIA DE JÂNIO QUADROS

  • Nasceu em Campo Grande, no dia 25 de janeiro de 1917
  • Em 1935, ingressou na Faculdade de Direito
  • Concorreu para vereador de São Paulo em 1947, pelo Partido Democrata Cristão, mas ficou como suplemente. Assume o cargo no ano seguinte
  • Em 1950 foi eleito deputado estadual
  • Eleito prefeito da cidade de São Paulo em 1953, aos 36 anos, pelo Partido Democrata Cristão apoiado pelo Partido Socialista Brasileiro
  • Venceu as eleições para governador de São Paulo e assumiu o cargo em 1955
  • Foi eleito presidente da República em 1960 e assumiu em 1961
  • Durante seu governo estabeleceu relações com nações do bloco socialista, em meio a Guerra Fria e recebeu visita de membros do governo chinês
  • Jânio também condecorou Ernesto Che Guevara, ministro da Economia de Cuba, com a Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul
  • Essas medidas provocaram uma crise política e a irritação de parcela dos militares
  • Renunciou à Presidência em 25 de agosto de 1961, após cerca de sete meses no cargo
  • Teve seus direitos políticos cassados em 1964
  • Entrou para o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) em 1980
  • Concorreu ao Governo do Estado de São Paulo em 1982, mas perdeu a eleição
  • Em 1985 foi eleito prefeito da cidade de São Paulo
  • Entrou para o Partido Social Democrata em 1989
  • Morreu em 16 de fevereiro de 1992, em São Paulo
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